quarta-feira, 15 de agosto de 2012

O sem-abrigo (excerto)


(excerto de um policial ainda em elaboração)


Fernando, aproveitando o fim-de-semana, levantou-se cedo deixando Mariana a dormir. Depois de tomar banho, vestiu um fato de treino e foi dar uma volta pela cidade. Gostava de deambular pelas ruas olhando as pessoas com quem se cruzava. Foi assim que conseguiu a maioria das ideias que complementaram os livros que escrevia. Sabia que não tinha grande talento para a literatura e como tal, uma vez que gostava de escrever, dedicara-se ao romance policial. O reencontro com o seu amigo Anselmo, companheiro do liceu, agora inspector da judiciária, proporcionara-lhe ter vivido e continuar a viver casos reais. Cogitava na vida e no porquê das pessoas enveredarem pelo caminho do mal e da podridão. Não aceitava mas compreendia que o homem pudesse enveredar, muitas vezes pelo caminho da violência. O Ciúme, os desencontros amorosos, as traições, as palavras amargas, poderão fazer um ser humano exorbitar e entrar em violência verbal e até física, mas viver do mal dos outros? Assenhorearem-se do alheio? Matar por prazer? Violar? Maltratar crianças? Como era possível? Nestas alturas vinha-lhe à cabeça que a maioria dos indivíduos que assim procediam, eram os chamados tementes a deus. Cometiam os maiores pecados e depois corriam até a um padre confessando-se e obtendo uma absolvição que os consolava, até uma próxima vez.
Para ele, a ideia de deus era inconcebível, tão inconcebível como o fantasma da sua avó andar lá por casa a tomar conta de tudo e todos, programando a vida deles. A maioria das pessoas crê num deus pessoal que tudo vê, tudo controla, tudo programa. Alguns intelectuais, não acreditando nisso, acham que ao homem foi dado o livre arbítrio, mas que existirá um deus cósmico, muito acima dos humanos, que com a sua batuta rege os princípios universais. Os maçónicos, normalmente anti-clericais, chamam-lhe o grande arquitecto. Carl Sagan diz, “isto é um mundo de idiotas”. Ao conhecer-se cada vez mais o universo, ficamos com consciência que a terra é um grão de areia no cosmos. Por que raio havemos nós de ter um deus? O que faz ele nos planetas desabitados? O que fez ele durante os milhares de milhões de anos em que não houve seres humanos? Pois! A mente humana tem muita força e cria deuses para se poderem perpetuar para além da morte. Não aceitando o fim de tudo, criam uma outra vida obra de deuses. Estava farto de dizer isto, mas tirando a família e meia dúzia de amigos, os outros olhavam-no como se do demónio em pessoa se tratasse.
Parou a observar um melro que transportava matérias de construção para o seu ninho. Aqui estava a natureza e as sua leis. Todos os seres tratavam da sua reprodução e não precisavam de deus para nada. Só o homem, na sua ignorância, o criara.
Assobiando baixinho reparou que já estava bastante longe de casa. Mariana já devia ter acordado e tinha que tomar o pequeno-almoço com ela. Estugou o passo mas o seu cérebro continuou a pensar...

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

A VIDA


(“Poema de pé quebrado” de má rima e pior métrica)

A vida quando vivida
Com gosto, com harmonia
Com fazer e desfazer
Com amor, com valentia
Sem medo e sem destino
Sem vendas e sem temor
Sem nenhum manto divino
Sem donos e sem senhor
Dá-nos descanso tamanho
Dá-nos tremendo vigor
Para aceitar o calor
Da força da natureza
Que em toda sua beleza
Nos conduz, com a certeza
De um belo fim sem temor.
Pena que é que o vil metal,
“Satanás” que o inventou
Pra atazanar nossa vida,
Nos cause tremendo mal
E nos faça em desatino
Alterar nosso destino
E provoque uma corrida
Sem retorno, contra o vento,
Para ganhar o sustento
Para conseguir comida
Para encontrar alento
De dar guarida e sustento
Àqueles que nos são queridos
E sem os quais não vivemos
Pois com eles, nós sabemos,
Que os queremos ao pé de nós
Prá vida ser bem vivida
Sem nos dar um fim atroz.
Bom seria atrás voltar
E nas cavernas viver,
Andar no mato e caçar
Todo o alimento preciso
E viver no paraíso
Sem um senhor a mandar
Que nos tolha a consciência,
Nos obrigue a trabalhar
E nos provoque a demência
Da riqueza procurar.