domingo, 19 de dezembro de 2021

Gato Preto, Gato Branco.

 

Já há muito que o meu filho me tinha falado num filme que classificou de excepcional e eu não cheguei a ver. “Gato Preto, Gato Branco” de Emir Kusturica, foi há alguns anos um êxito de bilheteira no nosso País. O filme tinha sido agraciado com um Leão de Ouro no festival de Veneza e teve excelentes classificações dos críticos. O Cinema Ideal na Rua do Loreto colocou novamente em exibição o filme agora com uma cópia restaurada. Desta vez não me escapou e fui vê-lo ontem. Depois de um trânsito infernal, nesta época anda tudo doido, consegui chegar à Praça de Camões para pôr o carro no parque. Tive de deixar a Catarina na esquina e que fosse andando para o cinema que eu tinha de guardar o carro. Conclusão: levei montes de tempo para entrar. Ora estava completo, ora livre, mas entrava-se a um e um. Lá consegui um lugar no piso -4 e tive de utilizar o elevador para sair e tentar “correr” até ao cinema. Cheguei uns bons minutos atrasado, coisa que me provoca um stress dos diabos. Ainda tive de mostrar o certificado de vacinação antes de me poder sentar. Parece que não perdi muito do filme. Mas falemos do dito:

No início o ambiente choca-nos um pouco pelo insólito das personagens, trajes e ambiente. A pouco e pouco vamos entrando na “história” e o choque vai-se desvanecendo. Numa comunidade cigana, penso que meios sérvios, que vive numa terreola à beira do Danúbio, vive-se de esquemas, trafulhices, roubos, festa e música. As pessoas, quase todas, feias, desdentadas, divertidas,  e trajadas de cores garridas, vão fazendo negócios duvidosos com soldados russos, tais como desviar comboios de vagões de gasolina. Um dos ciganos envolve-se num negócio com outro, “ganster”, rico, cocainómano e devasso, e fica a dever-lhe bastante dinheiro que não tem como pagar. O Malandro apresenta-lhe uma solução, casar o seu filho com a sua irmã mais nova, mas que não deve muito à beleza e é meia anã. Mas nem a anã, nem o filho do nosso cigano querem casar, uma porque está à espera do seu príncipe encantado e o outro apaixonado por uma linda rapariga filha da dona de uma tasca onde vende comida, bebida e cujo divertimento era, munida de uma carabina, atirar nos barcos que passam no rio destruindo os pertences dos seus proprietários. A partir daqui é o granel total. No casamento a noiva foge com o apoio do noivo e acaba por ser apanhada pelo filho de um outro “ganster”, esse ainda mais rico, altíssimo e de grandes bigodes e é o amor à primeira vista. Desata tudo aos tiros, mas lá se acalmam e resolvem por bem fazer dois casamentos. A música no filme é primordial e desde uma banda atada nas alturas ao tronco de uma árvore e de irem buscar um avô ao hospital com uma fanfarra a tocar por ali dentro e a tocarem nas festas, está sempre presente. No meio daquilo tudo dois gatos um macho branco e uma fêmea preta andam por ali como que a gozarem a maluqueira dos humanos, aproveitando tudo a que podem deitar a unha e fazendo “amor”. No fim acabam como testemunhas do casamento do rapaz. Cenas insólitas como uma partida que os noivos fazem ao “ganster” armadilhando-lhe a retrete de madeira  acabando o malogrado por cair dentro do “caldo”  interior e mal cheiroso à ressurreição de dois avôs que se pensavam mortos e tinham sido colocados num sótão com gelo em cima para que os funerais não adiassem o casamento, tudo aconteceu.

Dito assim parece uma comédia burlesca, mas não é, está lá muito ensinamento da vida. É realmente um filme insólito mas interessantíssimo. Valeu a pena.

domingo, 5 de dezembro de 2021

Tim-Tim

 

Até que enfim consegui ir ver a exposição do Tim-Tim que está na Gulbenkian. Uma exposição bastante completa e bem apresentada, mas é mais sobre Hergé e a sua dedicação à banda desenhada do que propriamente ao seu herói. Para alguém como eu, fã incondicional do Tim-Tim, não acrescentou muito.

Quando nasci, o meu herói já andava lá por casa. A revista O Papagaio apareceu em 1935 e a minha irmã também. A nossa tia e madrinha, irmã do meu pai, trabalhava na renascença e tratou de fazer uma assinatura, a que tinha direito, em nome da primeira sobrinha. Todas as semanas recebíamos pelo correio a revista que o funcionário dos CTT anunciava gritando “Pacagaio” o que nos fazia rir, mas corríamos a ir buscar a revista que nos deliciava. A primeira aventura de Tim-Tim publicada foi Tim-Tim no Congo que no Papagaio foi apresentada como Tim-Tim em Angola. A primeira aventura deste herói foi Tim-Tim no País dos Sovietes, mas Hergé deixou da editar por achar que era demasiado crítica e, portanto, já estava fora de contexto. Ainda não sabia ler e era minha mãe que me lia as filacteras e eu fazia-a voltar atrás quando algo não era para mim muito perceptível. Aos 6 anos entrei na primária e julgo que foi a vontade de ler sozinho as suas aventuras que me fez aprender a ler bastante depressa. Ficámos com as encadernações anuais da revista papagaio (11 volumes) que muito triste me deixou quando acabou. Todas as aventuras foram mais tarde redesenhadas e modernizadas por Hergê e passei a comprar os álbuns editados pela Casterman na sua versão brasileira. Muito mais tarde apareceu a revista Tim-Tim editada pela Bertrand. Era semanal e até em Angola a recebia enviada “religiosamente” por um tio da minha mulher, que líamos primeiro só depois a passando para o nosso filho. Infelizmente essa revista também acabou. Ficámos com cerca de 29 volumes que mandei encadernar e que ainda existem em casa do meu rapaz. Tudo o que saiu respeitante ao Tim-Tim eu adquiri ou me foi oferecido, inclusive alguns estudos apresentados por “experts” em Banda desenhada. O Tim-Tim era um herói infantil, mas muito lida também por adultos que viram nela não só aventuras infantis, mas também algo do íntimo de Hergé. Este foi por muitos acusado como anti-semita, misógino, etc. Chegaram a acusá-lo de alguma aproximação ao partido nazi. Penso que isso se deveu ao facto de querer continuar a trabalhar sem ser boicotado. Para mim, Tim-Tim ficou sempre o meu herói preferido. Para quem quiser ficar a saber muito do Tim-Tim, e seu “pai” Hergé, vale a pena visitar a exposição.