sábado, 25 de abril de 2015

25 DE ABRIL – SEMPRE

Penso que será talvez a segunda vez que publico aqui algo que não é de minha autoria. Fernando Queiroz de Azevedo já não está connosco, faleceu cedo de mais e perdi um grande amigo. Militar de Abril, incompreendido e muitas vezes atacado sem razão, era um homem com grande empenho em fazer do seu País aquele lugar onde todos seriam tratados com igualdade. Às vezes um pouco utópico, mas são quase sempre as utopias que levam os homens a porem em prática os seus sonhos. Vale a pena ler com atenção este excelente texto em memória do 25 de Abril.

25 DE ABRIL – SEMPRE
Com evolução permanente

Naquela madrugada da Primavera do ano de 1974 a aragem cortava no monte do Privilégio.
Era o dia 26 de Abril e tinha chuviscado na véspera.
A terra, ainda húmida, enregelava ainda mais o ambiente desconfortável do velho moinho meio desmantelado que servia de guarida àqueles dois pobres seres humanos.
A mulher levantou-se e antes de ir espreitar o romper da alva aconchegou mais o filho com os farrapos que lhe tinham servido de cobertura. No entanto já era tempo!
Dali a nada havia de nascer a manhã e eles tinham de pôr-se a caminho.
A mulher alisou os cabelos com as mãos, estragadas por mil trabalhos e carregos, e espreguiçou-se.
Era ainda nova, de menos de trinta anos, mas quem poderia acertar-lhe na idade ao fixar aqueles olhos sofridos, aquela expressão permanentemente distante, os lábios gretados na face encovada?
Passou a corroída porta presa por arames de fardo e saiu. 
Lá ao longe, para os lados de Odivelas, as luzes do casario pareciam pirilampos fulgurando aqui e ali. Era a prova de que os trabalhadores começavam a levantar-se para dar início a mais um dia de luta pela vida, mas ela não poderia ir fazer a entrega dos sacos de linhagem que cosera na véspera, durante todo o dia. Talvez nem no dia seguinte, pensou preocupada, se acaso não tivesse sorte com os transportes.
Paciência! O importante era conseguir fazer a viagem…
Antes de entrar no moinho contabilizou mentalmente os meios e haveres de que dispunha.
Era sempre assim todos os meses desde que ficara sem o seu homem, e assim continuaria a ser até que o reavesse, nem que tivesse que passar o resto da vida a partir lenha, a fazer recados, a lavar a roupa dos outros e a comer o pão que o diabo amassasse. Um dia havia de ter o seu homem de volta e tudo tornaria a ser diferente.
Recordando o companheiro o coração apertou-se-lhe de saudade e angustia.
Faziam-lhe falta aqueles braços fortes que a apertavam com ternura, a cara barbada a roçar-lhe na sua, o sorriso alegre, o cheiro do corpo suado a lavar-se no balde, às tardes, depois do trabalho de trolha. E o amor pelo filho de ambos! As horas de brincadeiras ingénuas com o bebé… Que homem tão bom!
Entrou. Lá estava o saco com o pão, bem apertado para não endurecer muito; as duas latas de conserva e o naco de toucinho. Para o miúdo havia também duas laranjas e se fosse preciso algum reforço levava os cobres amealhados com tanto sacrifício e que haviam de servir para comprar alguma coisa ao companheiro, quando chegasse a Peniche, se tudo corresse bem.
Acordou o pimpolho, de seis anos, que se levantou sem qualquer resistência ou queixume porque as suas reacções eram, desde há muito, sempre condicionadas pela luta comum da sobrevivência. Se a mãe o acordava ele levantava-se imediatamente, atento ao que fosse necessário fazer, totalmente identificado com a mulher que lhe dera a vida e que tanto amava à sua maneira de menino-homem que já não conhecia brinquedos e folganças.
Depois de breve arranjo saíram tiritando para o alvorecer que despontava e foram, carreiro abaixo, até à estrada de Loures, deixando para trás a silhueta trágica mas familiar do moinho.
Dali a escassos minutos estavam junto à tasca do Delfim, onde costumavam comprar o pouco que podiam. A réstia de luz e a porta entreaberta àquela hora eram indicadores seguros de que os camionistas podiam parar para matarem o bicho com a pinga de aguardente e o rabo de sardinha frita ou de escabeche. Era, portanto, provável que a sorte os bafejasse. Sempre havia boas almas com um pouco se solidariedade humana para correrem o risco de transportar dois passageiros clandestinos nas caixas de carga; que as multas eram pesadas e a polícia parecia nunca estar disposta a perdoar aos mais pobres.
Ao chegarem perto da réstia de luz verificaram que bem perto da porta da tasca estava estacionada uma carrinha de caixa aberta, contendo apenas alguns caixotes vazios e o coração da mulher encheu-se de esperança. Lá de dentro chegou-lhes o som de vozes alegres e sonoras gargalhadas: puseram-se à escuta mas a mulher só conseguiu perceber que falavam de liberdade. Isso avivou-lhe a mágoa permanente e, desinteressada, afastou-se um pouco da porta com o filho. Mas logo depois a porta abriu-se e saiu um homem cinquentão, baixo e gordo, seguido por uma mulher um pouco mais alta do que ele, rondando pela mesma idade.
 A mulher parou, a rir-se, virou-se e abriu a porta da tasca, de par em par, fazendo com que a luz do interior viesse avivar o crepúsculo matinal. Depois gritou lá para dentro: –  Anda daí rapariga! Deixa-o da mão, que o “ti” Delfim até agora ainda tem medo de ter a porta aberta para dar de comer à gente! … Raio do velho! – E a mulher levantou substancialmente as gargalhadas.
Uma mulher jovem apareceu logo e foi ela que reparou nos dois junto à parede da taberna, encolhidos e tristes.
Queríamos uma boleia… – balbuciou a mãe do garoto deixando no ar uma justificação murmurada.
Ó pai! Dás uma boleia a esta mulher e mais ao miúdo dela?
O homem, já a entrar para a carrinha, virou-se a custo para a filha e disse em tom alegre: – Eu dou, mas só se for na caixa de carga, claro está, mas olhem que os caixotes cheiram um bocado a peixe… se eles quiserem! … Levo-os até ao fim do mundo… O fim do mundo hoje é em Peniche… – gargalhou um pouco e acabou de enfiar-se na carrinha, deixando ao cuidado da mulher e da filha a “arrumação” dos dois fortuitos passageiros. Os caixotes foram dispostos a jeito e até havia um oleado que poderia servir para os proteger do frio.
Ah! Vossemecê quer ir até Peniche com o seu filho? – Perguntou a mulher do camionista, curiosa de saber mais coisas, assim que lhe disseram o destino que pretendiam. – Queremos sim, vizinha! É por via de uma tia doente que lá tenho… – foi a resposta apressada que cortou um pouco a alegria das outras. – Vai ver que há-de correr tudo bem para a velhota, deixe lá!
Mãe e filha entraram logo para a cabina e a carrinha arrancou, com cuidado, metendo-se à estrada. A porta da tasca do velho Delfim, cauteloso, tornou a semicerrar-se, não fosse o diabo tecê-las!
Aliviada, a mulher aconchegou o filho, puxando-o para si, e esticou um pouco mais o oleado, até quase o passar sobre as suas cabeças. Assim, no meio dos caixotes, ninguém os veria. Estava, portanto, tudo a correr de feição: Sorte, terem encontrado aquela família tão bem disposta e a dar-lhes boleia mesmo até Peniche. Não se lembrava de lhe ter acontecido tanta naqueles quatro anos em que tinha o homem preso… dois em que for a autorizada a levar-lhe o filho à visita uma vez por mês…
Com amargura, recordou o passado. A barraquinha de madeira, bem cuidada, ali à Paiã. O homem com trabalho certo, a cuidar da vida deles. Os poucos vizinhos sem nenhum interesse de fazerem perguntas…
For a o diabo ele ter fugido das sortes e ser descoberto!
Na altura ela já estava gravida. Por isso e por não querer ir para a guerra matar os pretos é que o seu homem havia faltado. Tinham vindo da terra fugidos os dois para Lisboa, que o homem dela não tinha letras mas era esperto como um coelho bravo…
Para a guerra não vou, lhe dissera, nem te deixo de barriga grande sem ninguém que te dê uma côdea. Não quero matar gente e muito menos na terra dos outros; que nada me convence que os pretos também são portugueses… se os tratam tão mal! … que o Chico da Júlia bem me contou o que por lá viu, de fome e porrada!…
Era assim, o seu homem, com aquelas ideias de bondade dentro do coração.
Nas obras por onde andara – sempre como servente para não ter que dar  o nome certo – tudo correra bem, que ele era um homem manso e trabalhador, até que outros homens lhe foram dizendo que a vida deles podia mudar…
O cachopo ia fazer os dois anos quando lhe tinham levado o pai. E ela sentira-o na carne e na alma.
De longe vira-os derrubarem-lhes a barraca, partindo e escavacando tudo. Até lhes tinham mijado para cima dos parcos haveres destruídos…
Nessa noite dormira abraçada à criança, dentro de uma moita no pinhal da Paiã, que os vizinhos haviam tomado o partido dos da secreta, e só passados dois dias ela pode aproximar-se, por mor da criança, para saber do seu homem e catar o que houvesse no meio dos destroços… Só que não havia nada; parecia até que nunca a casota deles tinha existido. Mesmo os restos inúteis o fogo posto por eles os levara; restavam as cinzas.
Um arrepio percorreu-lhe o corpo, e a desagradável sensação levou-a a puxar ainda mais para si o pequeno. Havia de o ter de volta, dizia-lhe o coração. Se tinha conseguido descobrir o seu homem na cadeia de Peniche… se sobrevivera até ali com o filho… havia de o ter de volta…
A mesma determinação todos os meses; a mesma certeza sempre reforçada ao ver no rosto olheirento do companheiro o sorriso bondoso com que ele olhava os dois durante os trinta minutos que durava a visita, com o guarda a assistir.
Os solavancos da carripana foram-lhe entorpecendo os sentidos e acabou por adormecer com o pequenito abraçado a ela.
A viagem foi longa porque o homem conduzia devagar, mas não houve incidentes que lhes pusessem em causa a boleia. Só em Torres Vedras, já a manhã tinha despontado, magnífica, uma grande algazarra os tolhera em súbito pânico, receosos de perderem tão boa boleia. Aquela gente parecia doida varrida, a gritar palavras sem nexo para um camião enorme cheio de soldados de armas em punho gritando também, e atiravam-lhes flores! … Que seria aquilo? …
Os da carrinha também tinham gritado, todos três, como se o homem ainda tivesse menos juízo do que as duas mulheres! E isso é que lhes tinha enchido o coração de angústia. Se fossem presos quando é que poderiam tornar a Peniche para ver o seu querido?!
Mas o camionista tinha a sua vida e nunca parou: Torres Vedras logo ficou para trás e o receio deles também…

Ao chegarem a Peniche a carrinha dirigiu-se ao porto, perto do Forte onde estava o seu homem.
Aí uma enorme surpresa aguardava mãe e filho. A praça encontrava-se repleta de povo que olhava o Forte.
Várias viaturas militares estavam estacionadas perto do portão grande e muitos soldados de fardas esverdeadas e espingarda em punho vagueavam um pouco por toda a parte por entre a multidão, falando amigavelmente com as pessoas. Lá em cima, nas muralhas do Forte, também havia soldados a olhar cá para baixo, para o mar de gente.
A carrinha parou. O homem veio dizer que os tinha de deixar ali e ajudou-os a saltar o pequeno taipal. Fez uma festa ao garoto e abanou a cabeça a olhar para a mulher, rejeitando o agradecimento que lhe via nos lábios. Depois conseguiu arrancar rumo à lota do peixe e foi dizendo, à sua e à filha, ser uma pena em dias daqueles ter-se pessoas chegadas da família assim tão doentes.
Os dois ficaram a olhar a cadeia, cheios de angústia, sem perceber o que ali se passava, os corpos doridos, o farnel na mão…

Um pouco mais tarde foi aquela alegria de nunca esquecer… os gritos do povo… agarrada ao homem com o filho entre eles…
A mulher poisou, num relance rápido, os olhos nos olhos do homem fardado de rosto tisnado, barba por fazer, expressão enérgica na face cansada. Tinha três galões nos ombros robustos e olhava neles por entre duas grossas lágrimas que lhe iam descendo pela cara, lentamente.
Sem sentir porquê a mulher sorriu e o homem dos galões dourados limpou a cara com as costas das mãos e sorriu também…

Trinta e oito anos passados o velho moinho já lá não se encontra, engolido que foi pela urbanização decorrente do histórico acontecimento. E a heróica mulher e o seu homem liberto labutaram depois quase junto a Loures, ganhando a vida com o suor dos seus rostos e a dignidade do seu trabalho, iniciado que tinham conseguido, num terreno baldio com barraquinha feita à maneira antiga, um expansivo negócio de ferro-velho, evoluído também para velharias.
Mas depois, quando a conscienciosa criança por eles gerada se foi transformando num “jovem leão” agarrando-se aos estudos com “garras e dentes”, por vocação própria (memória perene do sinistro moinho!) e seguindo o exemplo de tenacidade e grande coragem dos progenitores, consegui recompensá-los, já um rapagão, passados os necessários anos de luta constante para se cultivar, o que lhe facultou poder ajudá-los a mudar de vida, licenciado que ficou em advocacia, depois também, ainda melhor, com o doutoramento.
E então os dois já velhos lutadores puderam compreender, por via do filho e do seu próprio atroz sofrimento, as históricas mazelas da “gloriosa” Nação onde tinham nascido. Porque, a par de um Povo magnífico, cantado em versos e trovas por esse mundo fora que ajudou a desbravar, permanece ainda a malévola existência dos “vendilhões do templo pátrio” alheios ao povo para proveito próprio, como lhes convém… Herança terrível que aquele Capitão de sorriso amigo e coração puro, não pôde vencer com os seus camaradas… Mas o Povo Português um dia o fará, mais breve do que se possa imaginar, diz aos pais o doutor, porque os Portugueses se irão cada vez mais consciencializando da precariedade do sistema fraudulento, dito democrático que a eles lhes convém. Por isso o têm impingido ao Povo nestas últimas décadas, de tripa forra e de esbulho, como se comprova pela situação presente pós gorada a “Revolução dos Cravos”.
Revolução que deveria ter ocasionado um novo e melhor recomeço para Portugal, liberto dos crimes da ditadura que proporcionou o impasse da conjuntura colonial praticada ao longo de séculos, para dilatar a fé e o império, como então se afirmava.
Porque cada vez com maior clareza se constata a tremendamente cínica agressividade com que os fraudulentamente ricos estão a ficar cada vez mais ricos a par da miserabilização dos pobres e do definhamento progressivo da chamada classe média.
E diz ainda mais o motivado doutor de leis, profetizando que a par de um R.M.G. (rendimento mínimo garantido) para cada cidadão, que lhe permita usufruir das condições básicas da Existência Humana: alimentação, alojamento, vestuário, saúde e educação, por direito de nascença, mesmo que comprovadamente nada possa produzir, deverá também passar a haver o R.P.M.C. (rendimento e património máximos consentidos) para todos os outros cidadãos, por dever de equidade social e sobrevivência da Nação Portuguesa (e até da espécie humana) de acordo com o que cada um possa e deva produzir.
Ficarão assim criteriosamente escalonados todos os cidadãos sob a égide de um verdadeiramente Estado Democrático, presidido por um Presidente, eleito por todos os cidadãos com direito a voto, como seu principal representante; uma Assembleia representativa dos direitos de todos os cidadãos, eleita por estes e apenas a eles subordinada, tendo, como disciplina de voto, a consciência da sua representatividade perante os seus eleitores, de acordo com as propostas eleitorais que os promoveram a serem eleitos; respondendo criminalmente sempre que desvirtuem o cumprimento das actuações representativas.
Um Governo Executivo composto por técnicos profissionais de carreira, unicamente subordinados às necessidades de evolução do Povo, consubstanciadas no que mais convenha a essa evolução, de acordo com as directivas Presidenciais, baseadas no rigor dos textos constitucionais sem ingerências ideológicas de quaisquer partidos políticos que, unicamente, ao longo deste canhestro percurso, dito democrático, se têm interessado em serem os fâmulos das elites das classes sociais de quem dependem e servem.
E uma justiça independente de quaisquer forças políticas partidárias, obedecendo exclusivamente ao preceituado na nova Constituição, e sob a égide do Presidente da República, em representação do Povo Soberano.
Sim, o doutor simplesmente diz ainda mais, que a actual Constituição Portuguesa (e se calhar todas as outras por esse mundo fora) se encontra ardilosamente armadilhada, como se pode provar pela situação de falência fraudulenta a que o Povo Português está a chegar, o que nunca aconteceria se a Constituição simplesmente coarctasse todas as despesas que não tivessem cabimento no Orçamento Geral do Estado. Isto é, obviamente o mesmo que dizer que quem não tem dinheiro não pode ter vícios, sob pena de ir parar à cadeia! Que era onde deviam estar todos os políticos (membros do governo; autarquias; organismos públicos, etc.) que permitiram, e até incentivaram, despesas sem cabimento de verba, portanto, fraudulentas!
Haver vamos como este doutorado se comportará na sua carreira, porque novos capítulos iremos, por certo, pôr à disposição crítica dos nossos leitores que nisso estiverem interessados!



Fernando Azevedo


O Fernando morreu sem ver o seu sonho implementado, façamos nós alguma coisa em prol deste País.

domingo, 19 de abril de 2015

Que maçada!


Porque não massada?
Segundo as escrituras, não sei se nas velhas se também nas novas, um dos seguidores de Cristo era Simão o Zelota ou Cananeu. Parece que zelota em aramaico quer dizer zeloso e cananeu o mesmo, o que me deixa muitas dúvidas porque cananeu deriva de canaã e esta era a região de todos os israelitas. Ora os Zelotas, segundo essa mitologia, eram uma tribo judaica que nunca se deixou colonizar totalmente pelos Romanos. Eram assim uma espécie de armoricanos, ou seja, habitantes de Armórica, aldeia gaulesa, onde viveram Asterix e Obelix, que também nunca se deixou colonizar. Os zelotas eram uma tribo guerreira, basta ler o Novo Testamento e ver que Simão, quando o mestre foi detido pelos romanos, puxou da espada e cortou uma orelha de um dos soldados que, segundo as mesmas escrituras, Jesus logo colou com cuspo. Enquanto os outros se deixaram ficar pacificamente, o zelota, fazendo jus à sua fama, entrou logo a matar. Só que já andava “naquilo” há muito tempo e devia estar destreinado, em vez de trespassar o tipo no coração logo foi serrar-lhe uma orelha. Claro! Foi mais fácil, um coração não se cola assim com cuspo. Uma orelha sempre deu mais jeito. Parece que foi daí que ficou esta nossa mania de colar tudo com cuspo tal como estou a fazer com esta “história” e ainda fazemos com os selos. Bem, os zelotas eram lixados e os romanos já andavam fartos deles pois parece que lhes faziam uma guerra subversiva e, com umas sortidas e emboscadas estavam sempre a enviar uns quantos romanos para o inferno. Ora os zelotas aproveitaram um forte que Herodes tinha mandado construir no planalto de Massada e, foram com armas, bagagens e família, para aquela fortificação, onde as legiões romanas não chegavam devido ao acidentado do terreno cujas escarpas eram intransponíveis. Era daí que, de vez em quando, saíam em surtidas rápidas e infligiam aos romanos bastantes baixas. Mas os romanos tinham muitos argumentos e um deles era a engenharia militar. Um dos seus generais chamado Flávio Silva, talvez de família Lusa, resolveu sitiar Massada e começou a construir uma rampa, pelo lado oeste o mais acessível, bastante sinuosa é certo, mas que acabaria por permitir a aproximação às muralhas da fortificação. Os Zelotas, já debilitados pela falta de alimentos, devido ao cerco, e ao verem que as hostes romanas se iam aproximando, tomaram uma atitude radical, matando-se uns aos outros e suicidando-se os que restaram. Foi uma massada, ou seja uma maçada pela grafia que então adoptámos. Este episódio, ao contrário do da orelha, é histórico, dado que o historiador judeu da época, Flávio Josefo, o descreveu e foi posteriormente confirmado pela arqueologia. Desde aí, quando algo corre mal, dá para o torto ou tudo fica lixado, dizemos: “Que maçada!”

Não sei porque mudaram os dois ss para cê cedilhado, deve ter sido algum acordo, ou então é para não se confundir com massa de comer. Pobres Zelotas. Bem se lixaram. Que “Massada”!.

quinta-feira, 2 de abril de 2015

As Páscoas


Como não crente, mas interessado em estudos histórico-religiosos, sempre me fez muita confusão esta história dos coelhinhos e ovos da Páscoa. Coelhos? Ovos? Porquê? Ainda bem que hoje temos a internet. Evitei uma serie de procuras em enciclopédias e outros calhamaços e aí vou eu à procura de analogias. Já há muito que me debruçara sobre as Páscoas judaica e cristã, e até já tinha procurado umas coisas sobre o assunto aquando de um texto que escrevi para ser lido numa escola secundária. A palavra páscoa deriva do hebraico “Pessach” (passagem), pois comemora a passagem do Mar Vermelho que Moisés “abriu” para a travessia do povo judeu na sua fuga do Egipto para a Terra Prometida. Deus, na sua infinita misericórdia racista, flagelou os egípcios com sete pragas para obrigar o faraó Ramsés II a deixar sair os judeus, o seu povo eleito. O último flagelo foi a morte de todos os primogénitos, coitado do povo que nada tinha a ver com isso. Essa “maldade” foi só aplicada aos egípcios pois Deus ordenou que todos os hebreus matassem um borrego e com o sangue do mesmo fizessem uma cruz na porta para que assim o vírus maléfico não entrasse. Claro que esta balela não entra na cabeça de ninguém e muito menos deveria entrar na cabeça dos crentes, pois estes “sabem” que Deus é omnisciente e, portanto, saberia muito bem onde deixar entrar o espírito maléfico da morte. Mas, tradições e mitos existem e é por isso que os judeus comemoram a páscoa com borrego no forno. Bem bom! Mas já me estava a esquecer dos coelhos.
Como sabem, os povos antigos tinham tradições muito ligadas à fertilidade e, a deusa Astarte, dos assírios, era “padroeira” da renovação e como tal foi alvo de grandes oferendas e festividades que aconteciam precisamente no início da primavera, época de todas as renovações. Daí derivou a palavra inglesa “Easter”. O imperador Constantino, que estabeleceu a religião cristã como a religião de Roma (ICAR), no concílio de Niceia determinou a data da Páscoa, tendo em vista tornar as festividades ainda pagãs, como festividades cristãs (o mesmo aconteceu com o Natal) e, pela primeira vez se estabeleceu a data da Páscoa, mas deu muito trabalho a fixar, dado que, por outro lado, também aproveitaram para que a mesma se aproximasse da data da “Pessach” judaica. Ficou então estabelecido que se comemorasse no 1º domingo depois da 1ª lua cheia do equinócio da primavera. Ora a lua não anda às ordens de Deus e, portanto, não aparece quando se quer e como tal a data não é fixa. Talvez por isso a ressurreição de Cristo ao terceiro dia, não o ter sido pois de 6ª a domingo não vão três dias. Voltemos a Astarte.
Os sumérios, primeiros povos a deixarem mensagens escritas, tinham por costume considerar os ovos como fonte de fertilidade e renovação, pois deles saíam todas as aves e não só. Então construíam ovos de barro pintado e enterravam-nos em tocas e vários locais para serem depois encontrados, o que dava lugar a grandes manifestações de alegria. Mas as aves não enterram os ovos e penso que é daí que vem a ideia dos coelhos, que já por si também eram conhecidos como símbolos de grande fertilidade. Julgo também haver uma tradição alemã que conta uma história de que, quando alguns miúdos estavam a receber ovos coloridos, um coelho passou em correria, ficando a tradição que teria sido este a transportar e deixar os ovos. Enfim, muitas lendas vão ficando e as tradições também. Vejam como um povo que viveu há milénios, deixa marcas tão profundas que ainda hoje se mantêm.
Parece pois que há várias Páscoas e que as religiões vão aproveitando tradições para tornarem suas as ideias que já eram de outros.

Felizmente hoje os ovos já não são de barro mas sim de bom chocolate. O borrego aqui foi substituído pelo cabrito e o coelho safou-se pois só aparecem em peluche ou chocolate como oferta pascal. Ah! Ainda faltam as amêndoas. Será por serem parecidas com os ovos? Com isto tudo já me estará a dar a fome. Vou ver o que é que tenho para o almoço.