terça-feira, 7 de janeiro de 2025

O Quarto ao Lado

 


Raramente os filmes que tratam da morte conseguem fugir aos estereótipos dramáticos e pesados. Almodóvar foge aos seus temas favoritos que normalmente tratam de situações de homossexualidade e, desta vez debruça-se sobre o tema da eutanásia. Consegue tratar de um assunto demasiado sério, com uma leveza bela e até muitas vezes com humor subtil usando a amizade de duas mulheres que se reencontram passados alguns anos de afastamento. Serve-se de duas actrizes de mão cheia, Julianne Moore e Tilda Swinton, que dão um “show” de bem representar.

Uma escritora de algum sucesso, Ingrid (Juliane Moore), através de uma admiradora, acaba por saber que uma antiga amiga, Martha (Tilda Swinton), uma jornalista de guerra, está no hospital com um cancro terminal. Resolve visitá-la e é recebida com imensa alegria pela sua amiga que, após contar o que foi a sua vida até ali, confessa-lhe que sabe que vai morrer, mas que o quer fazer com dignidade e não se sujeitar a uma morte com degradação total. No entanto, informa-a que não o quer fazer sozinha e precisa de alguém que passe com ela os seus últimos dias e que ela saiba que estará no “quarto ao lado”. Após alguns excelentes diálogos Ingrid aceita a terrível incumbência de a acompanhar no seu desejo de morrer enquanto tem alguma dignidade como ser vivo. Martha aluga uma vivenda nos arredores de NY, no campo, e aí rodeadas dos cantos dos pássaros e de magnificas vistas, Martha diz a Ingrid que conseguiu através da “dark internet” um comprimido de eutanásia e quando ela vir a porta do seu quarto fechada será o sinal que o tomou e estará morta.

Entretanto, um ex-namorado que foi das duas, primeiro de Martha e depois de Ingrid, visita-a e sabendo do caso pede-lhe que tome providências pois irá ser interrogada pela polícia assim que esta souber do suicídio ali considerado crime e arranja-lhe uma advogada para a defender caso seja acusada como cúmplice.

Um Dia Ingrid chega a casa e a porta do quarto de Martha está fechada…

Aí vemos a diferença entre seres livres e inteligentes e um polícia retrógrado, católico fervoroso completamente “tapado” pelos seus conceitos religiosos.

E mais não conto. Vão ver o filme que vale a pena pela forma interessante como Almodóvar coloca uma questão tão controversa…

Um bonito filme muito bem conseguido.


Os nomes de família e as “peneiras”

 

Em conversa com o meu filho, ele chamou-me a atenção de que falo demasiadas vezes nos nomes dos meus ancestros e que isso pode ser levado por quem me ouve ou lê, como peneiras. Quem me conhece sabe perfeitamente que se há algo que não tenho são peneiras. Tive a sorte de receber como legado de uma tia minha, uma obra genealógica de um parente meu, que me deu a conhecer os meus ancestros desde o final do século XVI e isso é que me deu muito gozo. Conhecer as nossas raízes é bastante interessante. Tenho tanto ou mais orgulho no meu Avô materno, que foi guarda da PSP e acabou reformado como sub-chefe, do que tenho no meu Bisavô paterno que foi padre até falecer, mas que teve a capacidade de fazer frente ao sistema e ter vivido com uma nobre senhora criando dois filhos com quem sempre viveu e lhes ter proporcionado uma educação que os levou a licenciaturas.

Pena tenho eu de não conhecer quem foram os pais e avós do meu avô polícia que se orgulhava de ter amparado o Presidente Sidónio Pais no seu assassínio e ter prendido o célebre assaltante nocturno de Lisboa, o famigerado galego Ramon.

Pois é meus caros Amigos, não tenho peneiras nenhumas e falo no meu bisavô padre, que era o 2º de nove filhos de José de Sacadura Cardoso Cabral e Albuquerque assim como falo no meu avô polícia que conheci muito bem pois brinquei, em criança, com o seu apito que ele guardava religiosamente por muitas vezes ter servido para chamar auxílio em situações de aperto.

Nós somos aquilo que nos tornámos ao longo da vida e peneiras devemos ter por termos exercido uma profissão, chamar-lhe-ia mais um sacerdócio, que levámos a bom termo e com dignidade. Os nomes dos familiares ficaram para trás.

Ah! E tenho realmente peneiras de ter tido um excelente filho que só me deu alegrias e hoje é alguém. “Toma lá esta para não me chamares peneirento…”

 

domingo, 24 de novembro de 2024

A Vida entre Nós.

 


Farto da cinematografia norte-americana resolvi ir ver um dos filmes franceses que estão no cartaz. Escolhi este, mais pela indicação da menina da bilheteira do que por aquilo que li da crítica.

É uma realização de Stéphane Brizé, até aqui para mim desconhecido. Uma história banal de encontros e desencontros amorosos contada com alguma ironia e também um pouco de humor escondido, mas de forma tão lenta que chega a ser quase insuportável. As cenas são demasiado prolongadas e, pelo menos para mim, bastante desgastantes.

Um actor de cinema na ordem dos cinquenta anos, já com alguns êxitos que o tornam bastante conhecido, é convidado para interpretar uma peça de teatro. Quando tudo já está preparado para começarem os ensaios, o nosso personagem, contra tudo e todos, abandona o projecto e resolve ir para uma vila no Oeste de França, junto ao mar, relaxar num SPA durante duas semanas. Vai telefonando à mulher, que sendo profissional de TV não o acompanhou e se mostra bastante desligada, não achando bem o que ele fez, mas também não o criticando em demasia.

O nosso protagonista descobre que naquela vila reside uma antiga namorada que não vê há cerca de quinze anos Telefona-lhe e ela acede a encontrarem-se. Aqui começa o problema, pois descobrem que ainda se amam apesar de ela estar casada com um médico e ter uma filha adolescente. E é isto, contado muito lentamente sem grandes alterações emocionais apesar de no íntimo dela haver uma certa mágoa por ter sido abandonada. Voltam a dar umas quecas e acaba em separação de novo desta vez consentida pelos dois. Tudo muito lento e cenas prolongadas em demasia. Volta Manuel de Oliveira. Estás perdoado…

 

sexta-feira, 8 de novembro de 2024

A transformação

 

Esta humanidade está podre. Neste mundo nunca houve paz. Os homens, os tais tementes a deus, nunca se entenderam completamente. Sendo um ser gregário, parece que precisa viver em sociedade, mas também em guerra seja com o vizinho seja com quem for. O tal deus protector do homem, é uma fraude. Bem lhe pedem graças, mas ele faz ouvidos moucos e só envia cataclismos e guerras. Presentemente atravessamos uma época perigosíssima. As nações em vez de promoverem a conciliação, dizem que sim e mais que também, mas vão construindo e vendendo armas a quem pagar bem. Falam em paz e promovem a guerra. A sociedade dita capitalista e consumista está com tendência a entrar em crise. Os países asiáticos e mais alguns com visão diferente dos ocidentais estão a unir-se e a antiga ordem mundial está a desaparecer. Os USA cada vez estão mais com políticas que os vão fazer deixar de ser os senhores do mundo. A ganância do negócio vai perdê-los e quando se virem completamente ultrapassados só terão uma solução, a Guerra! O mundo vai colapsar e a porcaria da humanidade existente desaparecerá da face da Terra. Esperemos que outra surja que seja coesa e conciliatória. Não estarei cá, mas gostaria de viver numa sociedade diferente. Nos entrementes deus vai ficar de novo sem nada que fazer durante uns milénios. Também não fará falta…

terça-feira, 15 de outubro de 2024

Lee Miller – Na linha da frente

 

 

Mais uma vez fui ao cinema. Uma biografia de Lee Miller, fotografa da Vogue, baseada numa entrevista que dá ao seu próprio filho.

Realizado por Ellen Kuras, é apresentado em vários “Flasbacks” devido a fotografias que vão sendo apresentadas e relatadas pela protagonista. Bom filme, com uma realização bastante linear que poderia ser, quanto a mim, melhor apresentado e explorado.

Kate Winslet dá vida a Lee Miller, uma modelo da Vogue, que deixa a vida de boémia a que estava habituada e se torna fotografa da revista. Sempre com ânsia de “fazer mais” e já em Londres para onde se deslocou para seguir o seu companheiro, o pintor britânico, Roland Penrose, tenta que a mandem para a frente de combate onde não eram permitidas mulheres. Mas Lee Miller não descansa e se não consegue pela Inglaterra, tenta a Vogue americana e é-lhe conseguida uma autorização. E a partir daí vemos Lee Miller em várias situações perigosas e constrangedoras quando visita os campos de concentração já abandonados pêlos alemães. Mas se Lee Miller se entristece e comove com as cenas que fotografa, acaba também por se mostrar mordaz quando, acompanhada pelo seu compatriota David E. Scherman, também ele fotógrafo de guerra, visitam a casa de Hitler e Eva Braun e se faz fotografar banhando-se na banheira do Fuher com a sua fotografia ao lado.

Lee Miller relata tudo isto a seu filho que, praticamente não conhece a mãe, referindo-lhe episódios da sua vida que nunca contara a ninguém. Ficamos a saber que, em criança, teria sido violada por um visitante habitual da casa de seus pais.

Tudo muito seguido e contado com naturalidade. Como atrás referi poderia ter sido melhor explorado.

Kate Winslet revela-se uma excelente actriz a e sua caracterização entre mulher nova e de meia-idade é muito bem conseguida.

Não é genial, mas vê-se muito bem.

 

sábado, 28 de setembro de 2024

Telhados de vidro


Há muito que não ia ao teatro. Por sugestão do meu filho fomos ao teatro ver a peça Telhados de Vidro, ao Trindade, da autoria de David Hare (giro, David Lebre). O facto de ter como interprete Diogo Infante pesou na minha decisão. Ultimamente não tenho visto muito teatro. Hoje as formas de interpretação, pouco declamada como não era antigamente, fazem com que algumas falas passem despercebidas aos meus ouvidos, talvez um pouco já cansados. Mas, dei por bem empregue o meu tempo. Diogo Infante, hoje director do teatro da Trindade, é realmente um intérprete de excelência, e a Benedita Pereira, que só conhecia de algumas novelas, não lhe fica atrás. Um terceiro actor, Tomás Taborda vai muito bem e é uma revelação.

O tema da peça não é inédito, mas é-nos apresentado de forma moderna, ao mesmo tempo quase caricata, mas no fim trágica.

Um empresário de sucesso, completamente fascista e senhor de si próprio fica viúvo e visita a antiga amante que agora vive só, num pequeno apartamento, mas que viveu muito tempo junto da falecida, sua amiga, que trai mas, que abandona o seu amor ao pensar que a amiga tem conhecimento da ligação.

A conversa entre os dois mostra a distância de vida e pensamento dos ex-amantes, separados por ideologias antagónicas e valores morais, mas ao mesmo tempo com desejos recíprocos que os aproximam. A jovem, no início da peça, também é visitada pelo filho do seu amante, que, abalado pela morte da mãe se mostra bastante traumatizado pelo abandono quase total a que o pai o veta. Esse facto acaba também por ser um dos temas em desacordo entre os ex-amantes.

Ineditamente a peça tem legendas que apresentam ideias ou intenções dos intervenientes, mas que, no fim não se verificam. Interessante.

Ao ler o programa com um singelo resumo dos acontecimentos aprendi uma palavra que desconhecia totalmente, didascália. O meu rapaz sabia (é uma cabecinha d’ouro).

 

PS: Didascália ou rubrica são indicações cénicas para indicar como determinada acção, como determinada cena, como determinado espaço ou como determinada fala devem ser feitos em uma peça de teatro. Wikipédia

 

 

 

domingo, 22 de setembro de 2024

Daddio – Uma noite em Nova Iorque

 


Andava com algum interesse em ver este filme. Sabia-o todo passado num táxi entre o aeroporto JFK e Manhattan. Uma conversa entre uma passageira, cerca de 30 anos loura e bonita e o motorista, homem já para cima dos cinquenta. Pensava eu que ia ver um filme maçudo só de conversa e com pouco interesse. Felizmente estava enganado. A realizadora consegue “segurar” o espectador de modo a não cansar. Não se pode dizer que seja uma obra-prima com diálogos demasiado intelectuais. Não. Acaba por ser uma conversa entre um homem experiente, conhecedor dos seres humanos e duma mulher que tem um amante, homem casado com 3 filhos, mas que procura fora aquilo que acha já não ter em casa. O táxi acaba sendo um divã de psiquiatra em que, tanto a paciente como o médico, explanam as suas angústias, frustrações e modos de vida. O motorista, homem inteligente, consegue da moça confissões de momentos íntimos que nunca confessara a ninguém. Ficamos a saber que regressava da casa de uma meia-irmã,11 anos mais velha onde o pai nunca conseguiu expressar-lhe um carinho tendo apenas, uma única vez, despedindo-se com um aperto de mão.

Enquanto a conversa se processa, a moça mantém com o amante um diálogo, por Messenger, em que se nota o interesse apenas sexual do homem por uma rapariga muito mais nova.

A conversa acaba por ser quase um desafio entre os dois para ver quem se confessa e sobre o quê. A distância é longa e a viagem sofre apenas uma interrupção por motivo de um acidente. O diálogo não é interrompido durante esse hiato e apenas termina no final da viagem. No fim o motorista estende-lhe a mão e moça faz-lhe uma festa na cara. O interessante na realização é que não se vê ali qualquer interesse de ordem sexual, apenas transparecendo o gosto dos dois em conseguirem confissões expressas  a desconhecidos sabendo que, normalmente, nunca mais se encontrarão.

Freud deveria ter gostado. Eu não amei especialmente, mas achei interessante.

 

PS. Procurei o significado de Daddio e acho que é um eufemismo de Pai (Daddy).