“A bola é mulher não sabe o que quer”. Que me perdoem as
minhas queridas amigas que sabem que não sou nada machista. A frase foi escrita
por To Sam, pessoa admirável que tive o prazer de conhecer, numa “charge” ao
futebol carregada de humor. To Sam além de decorador, foi pintor, ilustrador,
escritor e principalmente um humorista de craveira ímpar. Tudo isto a propósito
dos futebóis, tema em que não me sinto nada à vontade por perceber pouco do
assunto. Mas realmente a bola é redonda e não sabe mesmo o que quer, pois
muitas vezes os que a pontapeiam querem que ela vá para um lado e ela
teimosamente vai para outro, sem conta nem medida. Mesmo percebendo pouco do
assunto, acho que para se jogar é necessário possuir-se jeito, muita perna e
maior pulmão. Os nossos rapazes da selecção têm imenso jeito. Já quanto a perna
parece que todos as perderam e quanto a pulmão nem se fala. Quando todos
ansiavam por uma vitória, ela esfumou-se e vá lá, evitou-se a derrota. É assim,
para uns ganharem outros perdem e às vezes empata-se. Os adversários não são
paralíticos e cada vez sabem mais daquilo. Mas não foi para isto que resolvi
escrever este texto.
Nós, os portugueses temos todos a mania que somos os
melhores do mundo e que havemos levar de vencida tudo e todos, mas não somos. A
comunicação social e o zé povinho endeusam tudo e todos e esquecem-se das
nossas limitações. O desporto, principalmente o futebol, faz libertar nos
indivíduos todas as paixões reprimidas pelas frustrações da vida, levando para
os estádios, ansias e desejos incontidos, que depois explodem e levam as massas
a comportarem-se quase como selvagens. O povinho, explorado por patrões e
governantes gananciosos e corruptos, vive triste e continua inculto pela
educação que lhes falta em casa e nas escolas, onde, mais uma vez o poder, cego
pela contenção orçamental, déspota nas decisões, não deixa a educação evoluir,
limitando os educadores a regras e normas emanadas dos órgãos centrais. Por
outro lado, a história que nos foi ensinada fez-nos crer que um povo
descobridor e aventureiro como o nosso, poderia levar de vencida todas as
tarefas. Esqueceram-se que os homens iam para as caravelas, para poderem comer
e tentar trazer de outras bandas aquilo que não conseguiam para sustentar a
família. Tivemos realmente meia dúzia de iluminados e estudiosos, que sabiam de
antemão aquilo que podiam vir a encontrar e daí tirarem o melhor proveito. E
realmente tiraram. Só que, mais uma vez, não foi o povo que beneficiou. A corte
enriqueceu e por encosto o clero também com os agradecimentos às divindades
pelos conseguimentos. O povão continuou paupérrimo e ainda hoje continua.
Depois apareceu um poeta, demasiado lírico, que enalteceu de tal forma os
feitos dos portugueses, que todos nós lemos e estudámos, acabando por colocarmos
o livro debaixo do braço, mostrando a tudo e todos: — Vejam, os portugueses,
nós, somos assim; Destemidos, valentes e determinados. Vencemos tudo e todos.— Santa
desilusão, somos iguais aos demais, com as nossas incapacidades e fragilidades.
Olha! Resta-nos dizer aos rapazes quando regressarem a
Portugal:-- Deixem lá, a culpa foi do Camões.