domingo, 1 de junho de 2014

Tintim antes, durante e agora


Em 1935, no mês de Agosto, nascia a minha irmã. Eu fiquei para mais tarde, apenas 19 meses depois. No ano em que a minha irmã nasceu, a nossa Tia e Madrinha, irmã de meu Pai, era funcionária da Emissora Nacional onde Adolfo Simões Muller era Director do Gabinete de Estudos e Programas. Este escritor, jornalista e pedagogo foi editor e fundador da revista de banda desenhada “O Papagaio” fundada nesse ano, tendo sido a primeira revista não francófona a publicar as aventuras de Tim-Tim. A minha Tia, amiga de Simões Muller, fez uma assinatura da revista em nome da minha irmã.
Quando nasci, já Tim-Tim, como então se escrevia, andava lá por casa acompanhado do seu cão Terrier “Milou”, que, no Papagaio era, erradamente, apelidado  de “Rom-Rom” que toda a gente pensava ser cadela.
Cedo comecei a devorar aqueles bonecos e Tim-Tim passou a meu herói. Não fui um sobredotado, mas aos seis anos já conseguia ler os “balões” com as falas das personagens e, julgo que foi o interesse nas histórias que me levou a aprender a ler depressa.
Tim-Tim foi uma criação do ilustrador belga Georges Remi (Hergé, pronuncia das suas iniciais do seu nome R e G) no suplemento infantil “Petit Vingtième” do jornal diário belga “Le XXe  Siècle”. Hergé foi o primeiro ilustrador de BD a pôr as falas a saírem directamente da boca das personagens através dos balões “filacteras”. A primeira aventura deste jovem jornalista foi Tintim no País dos Sovietes.
O meu Pai mandava encadernar as revistas de cada ano tendo no término da mesma um total de 13 volumes e alguns números soltos. No Papagaio publicaram-se 9 das aventuras do meu herói:

Tim-Tim na América, inicio no nº 53.
O Charutos do Faraó, nº 115 ao 161.
O Lótus Azul, nº 166 ao 205.
Tim-Tim em Angola (Tintim no Congo), nº 209 ao 244.
Tim-Tim e o Mistério da Orelha Quebrada (A Orelha Quebrada), nº247 ao 298.
Tim-Tim na Ilha Negra (A Ilha Negra), nº 301 ao 359.
Tim-Tim no Deserto (O Caranguejo das Tenazes de Ouro), nº 366 ao 426.
A Estrela Misteriosa, nº 435 ao 540.
O Segredo do Licorne, nº 617 ao 679.

Todas estas histórias foram os desenhos originais. Mais tarde, Hergé reformulou todas, modernizando-as para serem publicadas em álbuns.
Conheci assim, todas as versões do meu Tim-Tim e Rom-Rom que depois passaram a Tintim e Milou.

Todas as semanas, o carteiro tocava à porta e anunciava “Pacagaio”, trocando as letras ao nome, o que nos fazia sempre rir, e fazendo-nos correr para ver quem conseguia ser o primeiro a ler. Foi através das histórias de Tintim que “fiz” as primeiras viagens. Andei por Nova Yorque, Xangai, Port- Said, Singapura, Nova Deli, Katmandu, Tibete, Escócia, Congo e sei lá por onde. Mais tarde, já na minha vida militar, reconheci vários desses pontos através dos traços característicos de Hergé. Lembro-me de estar sentado no porto de Singapura e pensar para comigo “Já estive aqui”.
Após o Papagaio foram publicadas as seguintes aventuras:

O Ceptro de Ottokar
O Tesouro de Rackham o Terrível
As Sete Bolas de Cristal
O Templo do Sol
No País do Ouro Negro
Rumo à Lua
Explorando a Lua
O Caso Girassol
Carvão no Porão
Tintim no Tibete
As Jóias da Castafiori
Voo 714 para Sidney
Tintim e os Pícaros
E, a título póstumo, Tintim e a Alph Atrt

Só muito mais tarde, foi reeditado o álbum de Tintim no País dos Sovietes, que Hergé considerava ter sido uma crítica demasiado feroz ao regime comunista da União Soviética e, portanto, estar ultrapassado.

Mas foram as personagens companheiras de Tintim que mais me fascinaram. O Capitão Haddock, os detectives gémeos Dupond & Dupont, o professor Tournesol, o mordomo Nestor, o rouxinol milanês Bianca Castafiori, os Generais Alcazar e Tapioca, o famigerado Dr. Muller, o português Oliveira da Figueira, o japonês Mitsuhirato, o bondoso Sr. Wang, o adorável Tchang, o Xeque  Bem Kalish Ezab e o traquinas do seu filho Abdalah, o terrível Rastapopoulos, o miserável e milionário Carreidas, o sinistro Coronel Sponz, enfim tantos outros cheios de vida e humanidade que me cativaram e enriqueceram a juventude, continuaram a prender-me a atenção pela vida fora e ainda hoje revejo com interesse e emoção.

Tintim foi publicado em mais revistas portuguesas até aparecer a revista Tintim, da Bertrand, que adquiri desde o exemplar nº1. Mesmo em Angola, recebia-a semanalmente, pois um familiar encarregou-se de ma enviar sem falhar um nº. Dessa revista, o meu filho possui ainda todos os números encadernados em 26 volumes. Possui também todos os álbuns editados pela Casterman na sua versão brasileira.


Foi este herói e os seus companheiros que me ajudaram a moldar o meu carácter. Mais tarde apareceu Asterix de que muito gosto, mas não substituiu o meu querido Tintim, aquele impetuoso e generoso jovem jornalista de cabelo ruivo com poupa, calças à golf castanhas e camisola azul, defensor dos fracos e oprimidos, implacável para com os criminosos, mas sempre de uma humanidade a toda a prova.

2 comentários:

  1. Depois de ler a tua crónica, dei por mim a pensar no tempo do pilão. Naquela altura, quem tinha dinheiro, comprava, semanalmente, o "Cavaleiro Andante" ou outra revista de que já não recordo o nome, revistas essas que iam passando de mão em mão numa sequência ditada pelas simpatias dos donos.
    Também adorava o Tintim, mas a minha preferência ia para o Asterix. Já com filhos, comprava sempre todos os números que iam saindo, com agrado deles. Quando quiseram transmitir esse gosto aos filhos deles, não puderam competir com os portáteis. com os ipod, com os telemóveis.... Faltam-lhe aquelas teclas de premir.
    Parabéns pela crónica, e um abraço
    Tiago

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  2. Rui, também gostei muito de ler esta crónica que nos faz lembrar os tempos da juventude. Eu lia mais o Cavaleiro Andante que chegava a casa aos Sábados e depois fazia permuta com um amigo que assinava o Mundo de Aventuras.Obrigado e parabéns.

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