sábado, 11 de outubro de 2014

A morte do pombo


À morte ninguém escapa nem o Rei nem o Papa…”. Lembrei esta cantilena de miúdos ao encontrar um pombo morto na rua, durante o meu passeio matinal de sábado, esmagado por um automóvel. Pobre pombo que certamente andaria tão satisfeito procurando o seu sustento e a arrastar a asa à sua única companheira, sim porque os pombos são monogâmicos, assim como os católicos dizem que são, mas só perante os homens, porque perante o seu Deus muito têm que se desculpar, mas, dizia eu, ia o nosso pombinho feliz e contente e zás… “Mas eu sim escapo dela, compro uma panela que me custe um vintém…”. Será que se me meter numa panela que me comporte… “Meto-me dentro dela e tapo-me muito bem…” Bah! Não acredito, a morte vai dar por mim e lá vou eu para o bé-lé léu. A morte é mesmo uma chatice, acaba connosco em menos de um fósforo, transforma-nos em excrementos ou em cinza e lá acabamos. Há um pobre de um espermatozoide, um campeão, que corre que nem um desalmado para ser o primeiro a atingir a meta, consegue, entra no ovinho e lá ficamos nós para nascer em menos de nove meses. É pouco tempo comparado com aquele que se leva, às vezes para morrer. O nosso espermatozoide, com muito esforço, muitas das vezes debalde porque o conduzem para caminhos errados, lá consegue fazer com que do nada possa surgir a nossa vida e, depois, tarde ou cedo, lá vem a morte e puf… Será que haverá a tal panela?
Passa a morte e diz: Aqui não está ninguém…”. Pois! Fia-te nessa. Tal como o pombo vais morrer, só que eu sei disso e o pombo não sabia, ninguém tem culpa de o meu cérebro processar esse conhecimento. O pombo também já viu outros dos seus morrerem, só que não processa o conhecimento de que a ele também vai acontecer o mesmo. Já nós passamos todo o tempo a tentar, filosoficamente, encontrar formas de nos perpetuarmos. A morte é mesmo uma chatice e temos de a aguentar, a não ser que a panela funcione e, “Boa tarde meus senhores passem todos muito bem…”. Era  bom,  mas não funciona assim e o pobre do pombinho não tem uma alma para se evolar subindo até uma nuvem onde um fatito branco imaculado e uma lira o esperem condenando-o a tocar eternamente… Que chatice!

4 comentários:

  1. A morte da pomba

    António Barroso (Tiago)

    Passeia a loira co’ a morena amiga
    Ao longo dum passeio cheio de rosas,
    Trocando confidências amorosas
    E percorrendo as áleas, sem fadiga.

    Evitam machucar uma formiga
    Que passa pelas valas tortuosas,
    Porém ficam suspensas, ansiosas,
    De que, chegar ao ninho, ela consiga.

    Então, perto dali, algo há que tomba
    E a morena diz: - Olha uma pomba!
    E está morta, coitada, faleceu.

    E a loira, que não viu, diz à morena:
    - Aponta onde ela está. É uma pena!...
    E o seu olhar pesquisa o azul do céu.

    Parede – Portugal (11/10/2014)

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    1. Amigão. Só tu, grande poeta, farias um comentário destes. Obrigado e grande abraço.

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  2. Bem... realmente a morte é uma grande injustiça!... Tanto morre o justo como o pecador e além disso, só mesmo a religião para nos convencer que é uma bênção sermos compensados pela vida com a morte certa...
    Já quanto aos pombos não terem alma... não sei, não... Eles até voam e se calhar é porque a alma lhes serve de para-quedas... Além disso, sendo eles símbolo da paz, são muito capazes de ter essa coisa a que chamam alma... esse pequeno nada que ninguém sabe ao certo do que se trata...

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    1. Alma? Claro que têm. Lembra-te que foi uma pomba (espírito santo) que fez a "virgem" Maria conceber. Se isso não é uma alma, não sei que será. Obrigado pelo teu comentário. Ler o que escreves é sempre um prazer.

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