Fui ver “A Forma da Água”, filme
do mexicano Guillermo del Toro. Ia preparado para ver um filme tipo “O Monstro
da Lagoa Azul” que nos anos 60 era uma boa pastelada, mas felizmente que me
enganei. Del Toro mostra uma história fantástica do amor de uma rapariga muda por uma criatura de ficção, meio salamandra meio homem, que também se enamora
dela. Realmente, isto visto assim, até daria para rir, mas o que nos é mostrado
é uma América soturna, durante a guerra fria, preocupada com a espionagem soviética.
Ao mesmo tempo o filme põe em evidência a solidão. Solidão de uma rapariga muda
sem companheiro, que vive com um artista plástico bastante mais velho, também
ele solitário, preocupado com a sua homossexualidade latente. Solidão de um
animal estranho, retirado à força do seu habitat natural para poder ser
aproveitado para fins científicos, principalmente bélicos. Solidão do chefe de
segurança de toda a operação, um tipo mau e cruel, que tendo uma família normal
com filhos e uma mulher linda, vive obcecado pela sua função a ponto de
esquecer a família e optar por uma violência sem limites para atingir os seus
fins. Solidão do cientista que estuda o animal, espião soviético infiltrado,
mas que acaba por trair o seu país de origem pela vontade de continuar na
América, país que não sendo o dele, lhe dá a possibilidade de continuar a
aprender. Solidão dos espiões soviéticos, que não podendo utilizar o ser
aquático em prol do seu país o querem destruir só para que os Americanos também
fiquem privados da possibilidade de tirarem dali qualquer proveito. Del Toro
cria propositadamente um ambiente feio e frio em todos os cenários, quer nos
laboratórios secretos, quer nas residências dos intervenientes. Para contrastar
aparece o amor e a imaginação da protagonista, acompanhada por uma música de
fundo, quase toda ela de canções da época. Refiro particularmente uma das
canções, “Babalu” interpretada por Caterina Valente e seu irmão Sílvio
Francesco, que me fez regressar aos meus tempos de juventude quando apaixonado
por Caterina, comprava todos os seus discos e, perguntei a mim mesmo se, no
meio de todos os espectadores, e eram muitos por a sala estar cheia, quantos
terão identificado aquelas vozes. O fim do filme, sendo fantástico, ameniza
toda aquela solidão pela beleza de uma união etérea no meio aquático, se me é
permitida a incongruência. Não sendo uma obra prima, é um bom filme que merece
ser visto.
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