sexta-feira, 27 de março de 2020

Anfitrião



Anfitrião olhava a sua bela esposa e deliciava-se com a visão do seu corpo escultural. Os deuses tinham sido pródigos ao conceberem tal mulher. E fora ele o escolhido. Aproximou-se e passando-lhe os braços à volta do pescoço disse-lhe:
 — Sou o mais feliz dos humanos por ter sido contemplado com tão bela esposa, a mais linda mulher de toda a Grécia. Sabes, Alcmena, tenho de ir combater, a guerra em Tebas está no auge e todos somos precisos. Já sinto saudades e ao mesmo tempo ciúmes só de pensar que te vou deixar aqui só, onde tantos, incluindo os meus amigos, gostariam de te terem como amante e te olham como aves de rapina ansiosas por te cravarem as garras. Espero que me respeites e saibas resistir às investidas que por certo terás de aguentar. Todos os que recebo aqui na nossa casa não tiram os olhos de ti e já não sei se vêm por tua causa se pela amizade que me têm.
— Não te preocupes querido marido, só tenho olhos para ti e a minha cama é só tua. Vai em paz e preocupa-te apenas em voltar inteiro. Esperar-te-ei ansiosamente. O teu escravo, Sósia, velará pela minha segurança. Nunca vi homem tão fiel. Quanto aos olhares dos teus amigos tomo-os como galantearia e a todos sorrio e falo da mesma forma. Não me preocupa qualquer deles.
Lá em cima, no Olimpo, Zeus escutava a conversa e dizia para consigo: “Esta mulher tem de ser minha”. Chamou seu filho Hermes e disse-lhe baixinho.
— De que me serve ser o Deus dos Deuses se pretendo aquela mulher e não lhe consigo chegar?
Hermes pensou um pouco e disse:
— Senhor de todos nós e meu pai, sei que essa mulher, Alcmena de seu nome, é fidelíssima a seu marido Anfitrião, mas o Senhor, meu Deus, tudo pode, sei que Anfitrião partirá em breve para a guerra de Tebas, a sua mulher ficará guardada pelo escravo Sósia, nós, como deuses, temos a capacidade de nos metamorfosearmos. Poderá certamente tomar a forma de Anfitrião e eu de Sósia. Assim poderá substituir Anfitrião na cama de Alcmena simulando uma licença. Eu, na pele de Sósia, ficarei de guarda para que ninguém o incomode.
— Olha que boa ideia Hermes. Vamos esperar um tempo para que a pretensa licença de Anfitrião não levante suspeitas. Vou ser paciente, mas mal posso esperar. Sabes que tenho tido inúmeras terrenas, mas esta é especial, aquela beleza interfere com os meus divinos nervos. Esperemos então.
Passara-se um mês desde a partida de Anfitrião quando uma escrava de Alcmena apareceu correndo.
— Senhora, o senhor seu marido acabou de passar o portão principal.
Alcmena alvoroçada correu a receber o seu marido de braços abertos.
— Senhor meu marido não o esperava tão depressa, ainda bem que pode vir até mim.
Zeus (Anfitrião) beijou-a demoradamente e informou que tinha havido umas tréguas e por isso tinha obtido uma licença.
— Minha querida, estou ansioso dos teus carinhos. Prepara-me um banho e espera no nosso leito que irei correndo cair-te nos braços.
Alcmena gostou da fala do marido. Normalmente não se mostrava tão carinhoso e nem sempre tomava banho. Desta vez, estranhamente, estava atencioso e higiénico. Alcmena foi para o seu quarto e preparou-se para receber o seu homem.
Anfitrião (Zeus) chegou envolto num roupão de seda e carinhosamente abraçou Alcmena começando a despir-lhe a roupa interior ao mesmo tempo que lhe beijava o pescoço e o alvo colo. Alcmena estava encantada com esta nova atitude amorosa de seu marido e, enlevada, deixou-se acariciar sentindo todo o erotismo que o marido lhe estava a provocar. Tiveram horas de um amor intenso e Alcmena pela primeira vez conseguira orgasmos sucessivos. Nos dias e noites que se seguiram, as sessões de sexo continuaram intensas e explosivas. Infelizmente Zeus (Anfitrião) teve que “regressar” para a guerra. A Alcmena nunca lhe custou tanto a separação.
Zeus chamou Hermes e regressaram ao Olimpo.
— Hermes, que fizeste ao escravo Sósia?
— Chefe, meu Deus e meu pai. Pu-lo a dormir. Certamente hoje estará um bocado confuso, mas não se lembrará de nada.
— Ainda bem que fiz de ti o deus da magia e da divinação, não foras tu com essa miraculosa ideia e eu não tinha tido este curto período de amor intenso. Alcmena irá ter um filho meu e esse será um dos melhores semideuses. Será um terreno, mas com imensos poderes. Anfitrião vai orgulhar-se desse filho.
… Entretanto na Terra.
Anfitrião voltou da guerra e a vida voltou ao normal. Alcmena estranhou o seu marido. Que se passara durante a licença? O seu homem, já não tinha aquele ar tão carinhoso e o seu amor já não era tão intenso e explosivo. Algo se passara de estranho, mas Alcmena não o confrontou.
O parto correu normalmente. O bebé era lindo e forte. Desenvolveu-se a olhos vistos. Um dia a sua escrava privativa apareceu a gritar que duas serpentes estavam no berço sobre o corpo da criança.
Alcmena e Anfitrião correram temendo o pior. Chegados ao quarto pararam estupefactos, Herácles (Hércules) sentado sobre o berço, segurava uma serpente em cada mão presas pelo pescoço. Tinha estrangulado as duas.
O rapaz cresceu e fez-se homem. Era dotado de uma força poderosa. Casou e acabou por matar a sua mulher e os seus três filhos num acesso de loucura provocado por Hera, mãe de Perseu e também filho de Zeus. Hera nunca perdoou a Zeus ter dado sempre primazia a Hércules em detrimento de Perseu. Hércules foi instado por seu primo Teseu a visitar o oráculo de Elfos para limpar a sua honra. Como penitência teve que realizar doze trabalhos que lhe foram impostos. Realizou-os todos.
Anfitrião acabou por saber da traição de Zeus, mas este lá amenizou a coisa convencendo-o que para ele era uma honra que a sua bela esposa tivesse sido escolhida pelo Deus dos Deuses, e que ter tido um filho como Herácles (Hércules) era uma bênção. Anfitrião convenceu-se e nem contou a sua esposa esta visita do Deus.
Enfim, gosto de receber os meus amigos e recebo-os bem, mas quando me chamam de Anfitrião, não gosto lá muito…

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