segunda-feira, 16 de julho de 2012

O LANGÃO

O Langão não se chateia, não reclama. Vive do que lhe dão e não precisa pedir. Dorme quando quer, levanta-se quando quer. É meigo mas medroso do desconhecido. Não tem deus nem religião. Uns gostam dele, outros não lhe ligam nenhuma, outros têm medo e muitos são indiferentes. O Langão está-se nas tintas. Passeia com quem é amigo. Só tem um defeito; gosta demasiado de fêmeas e raramente lhe escapa uma. Assim que certos odores lhe passam pelo nariz, demasiado sensível, aí vai ele no seu trote desengonçado, até encontrar o local onde se encontra a coitada, normalmente encerrada. Espera pacientemente uma escapadela furtiva e trás. O certo é que as suas conquistas são normalmente bem-sucedidas. Nenhuma lhe escapa nem faz por isso. O pobre coitado, já de si magro, pelo pouco repasto que consegue, já tem os quadris meio encaracolados devido à actividade amorosa. É demasiado alto e as companheiras de ocasião nem sempre estão à medida. Já tem tido algumas brigas com outros que, como ele, também se querem aproveitar. Ultimamente anda mais encostado à civilização. Já reparou que há uns habitantes mais sensíveis e generosos. Tem uma amiga, das privilegiadas, que come todos os dias e dorme em cama fofa e recolhida das intempéries, com quem brinca mas não conquista. Infelizmente a companheira foi coarctada dos seus órgãos reprodutores e não tem qualquer apetência para as actividades amorosas. Além do mais é demasiado pequena para ele que é um bom matulão. Dão-se normalmente bem até que a pequena não se chateie da brincadeira, aí ela mostra dentes e às vezes até parte para a agressão.
O Langão merecia que alguém o adoptasse. Quem o levar arranja decerto um bom amigo. Eu e alguns vizinhos estamos a fazer tudo para isso, mas não é fácil. A crise e o modo actual de vida não é propenso a que se adoptem langões e, um “pointer” com uns bons 40 kg não é propriamente um bichinho para andar ao colo mas, será um bom companheiro para umas passeatas e até para a caça se ensinado para isso.
Enquanto um dono não aparece lá o vamos amparando na medida do possível. Pode não comer tudo o que necessita, mas de fome não morre. Entretanto, as cadelas da região, vão vivendo felizes.



4 comentários:

  1. adorei, com esta descrição é bem possível que se arranje um dono para o langão porque sem dúvida que ele merece. :)

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  2. Ó amigo Telo,
    gostei de ler este seu texto. Está magistral e com uma sensibilidade sumamente naturalista quanto baste. Parabéns. Se o Mangão não arranjar um protector mais consentâneo com o seu estatuto acho que, apesar de tudo, ainda é um «sortudo» comparado com outros da mesma espécie. Assim como assim, antes sortudo com vida de cão do que humano sem ter protecção!
    Continue, ó caro Telo, a escrever sobre estas temáticas "sui generis" pois não há por aí tanta gente com este talento para estas coisas. Por referência ao latim que aqui registo, não é por acaso que o faço já que, como sabe, houve escritores latinos que muito se inspiraram nestas temáticas e outras afins. Veja-se o caso do autor das "Metamorfoses", por exemplo...
    Um cordial abraço do poetAmigo Frassino Machado

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  3. coitado do Langão... É demasiado medroso, não deixa ninguém aproximar-se.

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