Ainda ninguém sabe o que se passou. Não há, por enquanto,
testemunhas alheias à tragédia. A única testemunha fez parte dela e salvou-se
com ajuda de pessoal dos bombeiros e polícia marítima. A judiciária tem o
processo em investigação e segredo de justiça, mas o povo português já sabe
tudo. Foi a praxe académica e aquele Dux é um assassino. Até pode ser que seja
tudo assim ou pior ainda, mas também pode ser que não seja. Mas os portugueses
já fizeram o julgamento. Foi o Dux e a culpada de tudo é a praxe académica.
Como é que isto é possível?
Os nossos Media já sabem tudo e têm tudo visto e previsto. A
campanha foi feita e estudada para
vender papel e tempo de antena. O governo aproveitou, pois assim o povo esquece-se
das coisas realmente más que por aí andam e, às quais quanto mais fugir e não
responder melhor.
A TVI chegou ao ponto
de fazer uma reconstituição de uma praxe baseada num escrito de Fernando
Pessoa, de um ritual demoníaco, aproveitada para praxar caloiros. Só que
colocou o caso de tal modo que, quem viu sem pensar, pode ter tomado aquilo
como realidade do que se passou. E se repararem, foi feito com esse intuito. A
histeria sobre o caso leva ministros a reunirem-se com direcções de
universidades e associações académicas. E depois de tudo isto eu pergunto: que
se passou realmente? Ninguém sabe.
As famílias querem responsáveis, o governo anda a
aproveitar-se, os media vendem papel e tempo de antena e os portugueses
histericamente alarmados, já fizeram o julgamento.
Responsabilizar a universidade? Como, se as praxes,
conselhos de praxe e quaisquer outras organizações de praxe e seus membros, são
completamente independentes da organização universidade? Como, se até aqui
havia e continuam a haver códigos de silêncio sobre o assunto? Como se pode
querer que reitores, directores, conselhos e outros órgãos, saibam o que se
passa fora, ou mesmo dentro, das universidades, se os assuntos nem lhes chegam?
Só se houver vigilantes, tipo agente secreto, que “bufem” para as direcções. E
mesmo que “bufem”, quem vai acusar quem? Proibir as praxes? Nem pensem. Nada se
resolve pura e simplesmente com proibições. Se assim fosse não havia drogados.
Veja-se o código da estrada, montes de proibições e todos os dias há mortes por
desrespeito às regras. Há praxes estúpidas e perigosas? Claro que há. E há,
porque infelizmente há também muita gente estúpida e prepotente no meio
académico. Mas se as praxes ultrapassarem aquilo que se considere (no meio)
aceitável, e entrar no campo do perigoso e do crime, há leis no país para julgar
e punir esses actos se tiverem coragem de os denunciar.
As vítimas da tragédia eram todas adultas, nenhum era
caloiro e todos, segundo consta, eram membros de conselhos de praxe já com
títulos atribuídos. Se estavam em algum ritual, só o sobrevivente poderá
esclarecer. Se era um ritual obrigatório e os colocou em perigo, sabiam a que
estavam sujeitos e eram voluntários. Correu mal? Correu e muito. Foi
propositado para lhes incutir sentimento de obediência? Talvez. Mas continuavam
a submeter-se voluntariamente e sabiam para o que iam. Pena foi não terem
respeitado o mar. Esse não perdoa e, mesmo sem rituais satânicos, leva muita
gente para a morte. Se houver crime, que seja julgado e punido. Não arranjem é
bodes expiatórios.