terça-feira, 12 de julho de 2016

O Castelo



(Gostaria de ser Kafka para poder escrever sobre Kafka)

Já li tanto e afinal tenho lido tão pouco. Fugi sempre de ler Kafka pela fama que o autor tinha de ser demasiado complexo e difícil. Resolvi ler o Castelo e digo-vos que afinal as opiniões estavam certas. O livro é difícil e difícil é escrever algo sobre ele.
Este livro, sendo de uma escrita corrente e descomplicada em termos de cursividade, é duma complexidade tremenda em termos de conteúdo. Um homem, considerado estrangeiro, por ser de fora, chega a uma terra com uma carta de chamada para exercer a profissão de agrimensor.
K, é esse o seu nome apenas, repare-se na inicial, ao chegar, prepara-se para se dirigir ao castelo, origem da carta que tem no bolso. A partir daqui é colocado perante várias dificuldades de atingir o seu objectivo apesar dos esforços que vai despendendo. Prosseguindo na sua vã tentativa de atingir o Castelo (o poder), vai conhecendo vários habitantes da aldeia que, por um lado, o vão admirando pela sua determinação de lutar contra o poder instituído, mas por outro lado, lhe vão criando imensos problemas, criticando-o por vir destabilizar a forma, acomodada, como viviam sob aquele poder, que respeitavam e até defendiam. Trata-se pois, de poder, do povo sob o mesmo, mas que até o defende por dele depender, e da oposição minoritária, que vai lutando contra tudo e contra todos tentando desmontá-lo, mas que só encontra entraves e desconfiança. Mesmo os poucos aliados que vai conseguindo, por um lado admirando-o pela sua coragem, por outro, criticando-o pela ousadia da sua tentativa que os destabiliza, acabam por o abandonar. O estranho da narrativa, é que toda ela se processa numa dialéctica nada adequada aos personagens, gente pobre de baixas profissões, mas rica e inteligente como se de intelectuais se tratasse. O Castelo, muralha intransponível e inacessível, com os seus senhores, que “despacham”, não em gabinetes como seria de esperar, mas numa pousada “Pousada dos Senhores”, em quartos, com os seus criados, secretários e servidores, todos eles, conhecidos pelos nomes, mas tão distantes e descaracterizados que muitos não os reconhecem, não se relacionam com quase ninguém abaixo da sua condição com excepção de algumas raparigas da aldeia com quem vão mantendo algumas relações, completamente dessentimentalizadas.
A forma como as personagens se relacionam e se entrecruzam, cria um sentimento de repulsa ao leitor a todo o ambiente, percebendo-se que a luta de K. é inglória e que ele próprio se vai acomodando com aquilo que o deixam ser e não com aquilo que quer ser. Enfim, a eterna luta contra um fascismo emergente numa Europa inter-guerras. Uma tentativa do homem contemporâneo em luta pela liberdade e contra os impérios. A influência da literatura de Kafka tem-se estendido a vários autores e em várias épocas. Lembro um, japonês, que admiro bastante, Haruki Murakami no seu “Kafka, à Beira-Mar” sobre o qual escrevi há pouco tempo. Bastante notória é também a influência de Kafka no seu romance “O Admirável País das Maravilhas e O Fim do Mundo”.


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