Excerto do meu livro "O Sem Abrigo", ainda em fase de ultimação.
...
Maria Clara deixou o autocarro e dirigiu-se ao Centro
Comercial. Ainda bem que a sua amiga Manuela lhe arranjara aquele emprego. Não
ganhava muito mas sempre era alguma coisa que, em conjunto com a pensão do
marido, dava para viverem os três com os mínimos aceitáveis. Onde estaria o
Alberto? Desde que encontrara o bilhete na mesa-de-cabeceira, nada mais soube
dele. Sentia-se mal por ter contribuído para a sua fuga. De que viveria? Teria
arranjado alguém? Os filhos sentiam saudades e ela dava-lhes esperanças de que
o pai voltaria.
– Vão ver que
qualquer dia aparece por aí. O vosso pai é empreendedor e de certeza vai
conseguir obter aquilo que pretende para poder voltar.
O que dizia saía da boca para fora mas sem grande
convicção. Sabia que a vergonha de não ser capaz de prover às necessidades da
família tinha sido a causa do seu afastamento. Sentia saudades do seu homem,
mas os tempos estavam maus e não iria ser fácil para ele encontrar soluções. Se
não conseguisse nunca mais voltaria. Sabia como ele era capaz dos maiores
sacrifícios para manter as suas decisões. De qualquer modo esperaria por ele.
Era o seu homem. O facto de se ter ausentado sem carteira nem documentos
preocupava-a. De certeza tinha mudado de identidade para não ser encontrado.
Sobre as suas dúvidas não falou com os filhos.
Chegou à loja antes da hora. Desligou o alarme e abriu a
porta. Começou a preparar tudo para a abertura. No meio da manhã a sua amiga
apareceu;
– Então Maria
Clara, como vai o negócio?
– Olha, amiga, para os tempos que correm isto até não
está mal. Vendi dois conjuntos de saia e blusa, duas malas e um lenço de
pescoço. Se continuar assim enriqueces num instante e vais passar férias para
as Caraíbas.
– Pois. Faço isso quando arranjar um homem que mereça a
minha companhia. Pelo que sei deles, amanhã não será a véspera desse dia.
Maria Clara tinha pela amiga grande consideração.
Divorciada, conseguira com os parcos recursos que amealhara e alguma ajuda da
mãe, arrendar aquela loja. Assim que se livrou do marido, que era um grande
calão e pensara viver à custa dela, deu a volta por cima e emancipou-se
totalmente. Desinibida, bonita, elegante e culta, era requestada por imensos
homens, mas Manuela não se deslumbrava. Saía de vez em quando com algum que lhe
agradava, mantinha um romance durante uns tempos e largava-os quando as coisas
começavam a entrar na rotina. Era a forma, dizia ela, de ter homem sem
compromissos. Maria Clara gostaria de ter feitio para isso, mas os filhos e a
esperança de que o seu marido voltasse inibiam-na. Mais de uma vez esteve para
aceitar o convite da amiga para saírem juntas e irem beber um copo a um bar,
mas não era capaz. Limitava-se a ir com ela até um cinema e sempre às matines.
Depois a amiga levava-a a casa no carro para junto dos filhos.
– Assim – dizia-lhe Manuela, – ainda vais para freira ou
envelheces em menos de um fósforo e, quando deres por ti, estás velha e
perdeste a tua vida à espera de um homem que fugiu das suas obrigações.
– Não digas isso, a grande culpa foi minha pois não o
apoiei o suficiente e ainda por cima só lhe dei cabo da cabeça acusando-o de
não ter sabido cuidar dos negócios. Ele não teve qualquer culpa. O mercado
absorveu-o e liquidou-o. Sinto-me imensamente mal por não o ter apoiado mais e
não lhe ter dado incentivos para aguentar. Agora não sei nada dele, se é vivo
ou morto, onde está ou, estando vivo, se está bem ou mal.
− O Alberto, pelo que sei dele, é um tipo esperto,
honesto e cumpridor. Foi-se embora para não vos sujeitar ao seu fracasso, mas
tudo muda e nesta vida nada é definitivo, se surgir uma oportunidade ele
agarrá-la-á e volta para vocês. Tem paciência. E, como parece que gostas muito
dele, uma vez que lhe continuas fiel, espera e serás recompensada.
Manuela foi-se embora quase ao fechar da loja. Maria
Clara preparou tudo para o dia seguinte. Fez as contas, meteu o dinheiro num
envelope dentro da mala e saiu. Ainda no Centro depositou o dinheiro no cofre
nocturno de uma das dependências bancárias. Em casa, os filhos já tinham
preparado parte do jantar e estudavam nos seus quartos. Preparou o resto da
refeição e chamou os filhos para a mesa. Viram televisão até às dez e mandou os
pequenos para a cama. Maria Clara ficou um pouco mais mas deitou-se antes das
onze. Já na cama pensava como seria bom ter o marido a seu lado.
Recordava como ele era terno e amoroso para com ela, como
faziam amor sem tabus ou quaisquer complexos. Um frémito percorreu-lhe o corpo
e pegou num livro para tentar apagar as visões. Pouco depois adormecia com a
luz acesa deixando cair o livro.
...
São três horas da madrugada,substituí o livro pelo computador( ao menos este não poderei deixar cair ) e eis-me insóniado (nem sei se existe o termo) a ler o lindo pedaço de prosa do seu livro que ainda vai nascer! sinceramente, conhece-me bem, os ingredientes estão lá todos, bem polvilhados para virem a proporcionar o romance que, de certeza, já está feito no seu espírito! Acredite que o pouco que pude ler me despertou a curiosidade e me arrastou a atenção até á letra final! espero pelo resto, pois gosto de ler um bom livro e temos, também, de mostrar que a literatura não está morta em Portugal. Coragem e bem haja. Jaime Moura
ResponderEliminarSe eu tivesse o seu talento de descrever sentimentos e os juntasse a alguma facilidade que eu tenho de construir personagens, talvez encontrasse um final decente para esta tentativa livresca. Assim tenho de esperar que alguma musa emerja qual tágide e me ajude na minha incapacidade. Prometo que fique a história boa ou má, que lha enviarei. O meu obrigado e abraço
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