Ana estava em casa há tempo demais. Já não sabia como fazer para se entreter. Começou a pensar que tinha de arranjar um emprego, mas as coisas não andavam fáceis mesmo para licenciados. A mãe dizia-lhe que se deixasse ficar, que não tivesse medo de se tornar pesada, felizmente não tinham problemas de dinheiro e assim podiam fazer companhia uma à outra.
– Mãe, eu sei que gosta imenso de me ter por cá, que gosta da minha companhia, mas não podemos passar a vida juntas, já fizemos todas as compras possíveis, já contei a minha vida em África dezenas de vezes. Preciso de me sentir útil e aqui em casa não há nada que fazer, nem sequer me posso meter em assuntos para os quais temos empregados. Penso que até ficariam ofendidos se me vissem a passar a ferro ou a limpar o pó. Vou começar a mexer-me para ver se arranjo qualquer coisa para fazer. Pode ser que apareça algo pela Net e vou também pôr um anúncio e pedir à Guida que vá falando aos amigos. Psicólogos são sempre precisos e não faço questão de ordenado, o que vier serve porque eu quero é uma ocupação e largar os pensamentos que estão sempre a voar até África.
– Quando é que deixas de pensar nele? Tens é de te distrair, sair com amigos, ir a boites e bares. Pode ser que encontres alguém que te agrade e faça esquecer esse caçador mentecapto.
– Pois, agora fala assim, mas eu sei que a mãe sempre adorou o Ricardo, dantes não lhe chamava nomes.
– Tens razão. Sempre gostei dele. Não sabia era que te ia levar daqui e meter-te naquele degredo. Fiquei aqui a consumir-me, a pensar que podias ser comida por algum leão ou mordida por uma aranha ou escorpião. Brrrr! Só de pensar fico com pele de galinha.
– Mãe! – Ana soltou uma gargalhada. – Isso são histórias, quando lá estamos nem pensamos nisso. Essas coisas existem, mas raramente aparecem e se aparecem não fazem mal a ninguém. De qualquer modo é preciso algum cuidado. Lembro-me de sacudir as botas antes de as calçar. Foi uma das regras que Ricardo me ensinou.
– Pois. E dizes tu que não havia perigo.
Ana riu-se e abraçou a mãe. – Deixa lá. Agora estou aqui e os perigos são maiores, posso ser assaltada ou atropelada nessas ruas que são maior selva de que aquelas por onde andei. Bem, vou deixar-te e ter com a Guida. Aquela maluca descobriu que num centro comercial há umas malas que ela ainda não tem e anda louca para comprar uma. Nunca vi ninguém que gaste tanto em roupas e adereços. Xau. Volto cedo.
– Adeus querida, diverte-te.
Ana saiu e meteu-se no pequeno Smart que o pai lhe comprara, assim não precisava de estar sempre a utilizar o dele. Era o carro ideal para a cidade, fácil de condução e de arrumar.
Guida levou Ana fazendo-a correr quase todas as lojas da cidade. Via tudo, esmiuçava tudo e nada estava a seu jeito. Comprou uma mala, umas botas, um casaco, um gorro e se mais não comprou foi porque Ana já não podia com os pés e ou ela acabava com aquilo ou tinha de ir descalça para casa.
Ana deixou-a no apartamento e rumou a casa. Estava exausta. Começava a cansar-se daquela vida de futilidade. Deu por ela a almejar o silêncio, uma boa leitura, enfim, o sossego da sua casa de África.
Já em casa e na tranquilidade do seu quarto, Ana pensava na vida e naquilo que ela considerava uma grande complexidade da mesma. As pessoas, por mais que tivessem uma actividade que as satisfizesse, dinheiro, amigos, conforto, etc., não passavam sem uma companhia que as completassem. O amor e o sexo eram primordiais e uma coisa não funcionava sem a outra. Sabia que existiam raparigas e rapazes, que punham o sexo à frente de tudo não se importando com o amor. Pensava que essas pessoas, no fim, não eram felizes. Após a satisfação do sexo, ficava sempre um vazio. E, o amor era tão fácil de aparecer e obter. Era uma questão de entrega total e de pequenas atenções e carinhos recebidos. Poderia não durar muito, mas enquanto durasse era muito bom e compensador. Ana deu um salto da cama e foi para o duche. Aí, enquanto se deliciava com a água quente e o gel cremoso que ia espalhando pelo corpo, pensava como seria bom estar a fazer amor com o seu Ricardo. Não resistiu e masturbou-se até um orgasmo intenso e prolongado a deixar relaxada, mas ao mesmo tempo um pouco frustrada por o ter obtido sozinha.
À noite, na cama, Ana recordava os bons momentos passados na sua casa no mato. Até já nem se lembrava dos motivos que a tinham feito fugir. Tinha de voltar, só não sabia como ultrapassar os constrangimentos. É sempre assim, arranjam-se os conflitos, vêm os arrependimentos, mas o constrangimento que fica, pelas palavras ditas ou acções intempestivas, é sempre difícil de ultrapassar.
Esperaria pela resposta à carta que escrevera a Ricardo. Do que ele dissesse dependeria a sua atitude, mas estava disposta a contemporizar só para estar com ele.
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