sexta-feira, 11 de maio de 2012

O PACAÇÂO


(Excerto de "Caçador Branco")

 

O carro serpenteava por entre os arbustos, procurando os melhores caminhos. Ricardo ia ao volante com Ana ao lado. Rogério, em pé atrás deles, segurando-se com uma das mãos à armação de ferro, com a outra agarrando os binóculos com que perscrutava a zona, atento a qualquer sinal de movimento.
Uns minutos mais tarde Rogério deu um toque a Ricardo que parou o jipe. Sussurrando, disse:
– Estás a ver ali mesmo em frente, às doze horas? Está uma manada de umas seis pacaças. O macho está uns metros mais à direita e meio camuflado com a vegetação. Passa aí os binóculos à Ana para ela as ver.
Ana pegou nos binóculos que Ricardo lhe passou e olhou na direcção indicada. Ao ver as pacaças a adrenalina começou a fazer os seus efeitos e o coração bateu-lhe mais apressadamente. Era uma visão magnífica ver aqueles animais pastando placidamente. Mal sabiam elas que daqui a uns minutos estariam sob o fogo dos que os pretendiam caçar. A vida era realmente estranha, todos eram predadores uns dos outros, mas a carne daqueles bichos era muito necessária à sobrevivência das populações e também base de negócio de quem lha fazia chegar. Alguém teria de fazer aquele trabalho, qual magarefe o faz nos matadouros. Ao menos ali, podiam viver-se momentos de algum prazer no trabalho.
Ricardo indicou a Ana qual era o pacação e deu-lhe todas as indicações de como iriam fazer a aproximação. Ensinou-lhe como determinar a direcção do vento e como deslocar-se com um mínimo de ruído. Rogério iria postar-se numa posição que levasse as pacaças fugitivas a deslocarem-se para o lado contrário, ao mesmo tempo, Ricardo e Ana entrariam pelo meio, de modo a cortarem o caminho ao pacação que procuraria acompanhar a manada. Seria nessa altura que Ana teria de atirar.
Avançaram mais uma centena de metros e pararam o carro. Saíram os três e Rogério deslocou-se para a esquerda. Ricardo e Ana seguiram juntos a uns dez metros um do outro. Quando o pacação deu por eles, já se encontravam à distância de tiro. O bicho bufou e a manada arrancou fugindo de Rogério. Foi então que o pacação os viu. Fixando-se em Ricardo avançou de cabeça baixa rasando o terreno com os cornos e bufando como um comboio a vapor. As pernas de Ana tremiam. O bicho aproximava-se perigosamente de Ricardo e este não reagia. Ana estava quase a entrar em pânico. Como Ricardo não tomasse qualquer iniciativa Ana meteu a arma à cara e disparou. O pacação abateu-se a poucos metros de Ricardo que continuava imperturbável. Ana sentou-se no chão chorando copiosamente. Ricardo batia palmas.
Rogério aproximou-se. – Então Ana? Estava a ver que o Chefe, desta vez ia para o galheiro. Porque disparou tão tarde? Foi para testar a coragem do grande caçador branco?
Ana, enxugando as lágrimas disse: – Não venho mais. Isto não se faz. Porque é que aquele sevandija não atirou? Foi para me matar de susto?
– Se eu tivesse atirado nunca saberia qual a tua presença de espírito. Disse Ricardo Agora sei que posso contar contigo e que é fácil deixar a vida nas tuas mãos. Foi um tiro de mestre. Nenhum de nós faria melhor. Foste aprovada.
...

1 comentário:

  1. Olá, Telo.
    Da maneira como descreves a cena, encontramo-nos, com as tuas personagens, a partilhar da caçada e da adrenalina da Ana. Estou em crer que viveste grande parte das tuas histórias.
    Excelente.
    Um abraço
    Cruz

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