(Escrito antes do Saramago ter escrito o “caim”. O dele foi plágio.)
Adão tinha acabado de dar a dentada na maçã e já estava arrependido. Pela primeira vez tinha dado pela existência da pila. Tanto xixi que expelira e só agora tinha notado aquela vontade de coçar aquela excrescência. O corpo da Eva apareceu-lhe sob outra forma. Apetecia-lhe deitar-lhe as mãos e explorar tudo por ali. Nunca a sua cabeça estivera tão confusa. Porra para aquela dentada. Deveria ter resistido e não comer aquela merda. A Eva insistiu, insistiu e foi o que se viu. Nunca tinha tido frio, agora tinha, nunca tinha tido vergonha, agora tinha, nunca do tinha tido tesão, agora tinha. Bolas! Quem mandou o mestre ter colocado ali aquela árvore. Não se faz! Foi maldade pura. E ele que julgava o mestre um ser bom e misericordioso. Bah! Aquilo fora maldade. Para quê encher-lhe a cabeça de dúvidas? Até já estava a pensar arranjar outro mestre. Haveria? Se não houver inventa-se…
Viu umas plantas e lembrou-se de arrancar uma folha. Com aquilo tapou a gaita. Pelo menos assim a Eva não via e talvez não fizesse perguntas. Quando ela apareceu viu que tinha tido a mesma ideia. Uma folha tapava-lhe a crica. Bem. Pelo menos assim, não vendo, talvez aquela impressão comichosa lhe passasse.
Os bons tempos foram-se. O Paraíso já não era o que foi. Porquê esta mania de alterar as coisas? Agora até sentia vergonha. De quê não sabia bem mas, pelo sim pelo não escondeu-se. O mestre apareceu e perguntou: – Adão, onde estás? – Mau! Agora o mestre não sabia dele? Sempre soube, porquê agora ter dúvidas? Então o mestre não era omnisciente?
A medo lá resolveu aparecer. Levou um raspanete dos antigos. – Parece impossível! Homem dos demónios. Porque pecaste?
Pecar? Que merda era aquela? Apenas tinha comido um bocado da maçã que a Eva lhe dera. Era o que fazia sempre quando ela trazia fruta. Não que gostasse muito. Borrego assado era mais do seu gosto, mas enfim… uma frutita não caia mal. Mas o mestre estava bravo e chamou-lhes todos os nomes. Aquilo não se fazia. Tratar assim um pobre homem que apenas obedeceu à mulher.
A Eva estava cabisbaixa. Adão tinha a impressão que ela sabia qualquer coisa que ele ignorava. Foram expulsos do paraíso e passaram a viver na terra que era mais ou menos a mesma coisa mas mais chato. Havia frio e as bichezas eram esquivas e algumas muito más vizinhas. Tiveram mesmo de fugir de vários animais que os atacavam com vontade de os comer. Lá no paraíso era ao contrário. Comiam eles os bichos. Mas na terra estava-se melhor. Podiam fornicar e era muito bom!
Não soube bem como acontecera mas a Eva começou a andar enjoada e a barriga crescera à brava. Depois nasceu um puto e depois outro. “Ganda” chatice, os gajos não o deixavam dormir, berravam que se fartavam só se calando quando a Eva lhes metia as mamas na boca. Ele também gostava disso, só que agora, aquela chata, não deixava. Até já nem queria aquilo do mete e tira tantas vezes como ele. Que remédio senão dormir com o pauzinho de fazer chichi todo inchado.
Um dos putos era muito sossegado e o outro um espalha brasas. Passavam a vida à bulha por tudo e por nada. O mestre aparecia pouco e quando o fazia era só para lhe azucrinar o juízo; Que tinha de lhe obedecer, que tinha de o adorar, que tinha de lhe rezar, que tinha de lhe oferecer sacrifícios… porra! Tanta merda? Porquê? Porque não o deixavam viver em paz?
Os putos cresceram e só lhe davam chatices. Sempre à bulha. O Abel era um sonso da do caraças, fazia tudo pela calada, era aproveitador, era queixinhas ao mestre a torto e a direito, mas fazia tudo o que era preciso sem se lamentar. O Caim, pelo contrário, embirrava com tudo e todos, mas não tinha mau fundo, só que fervia em pouca água e não gostava de meias-tintas. Trabalhava que nem um cão, vociferava, esbracejava, estava-se nas tintas para o mestre e dizia aos pais e irmão que eram uns parvos em se sujeitar às merdices daquele Zé das barbas, que o gajo era um intrujão e que devia era ir para o inferno, que ainda não tinha sido inventado, mas que era bom que se inventasse para mandar para lá os falsos anjinhos e os aproveitadores dos outros.
Adão já não sabia o que fazer e estava até a pensar que eles tinham era falta de mulher, pois ele quando se sentia bravo dava uma queca na Eva e passava-lhe a embirração. Só que mulheres não havia e ele já pensava que tinha de fazer era filhas e que se lixasse o incesto.
Quando tudo estava a correr melhor e os putos, já uns homens, se davam relativamente bem, o Abel foi dizer ao mestre que o Caim era um herege, que não aceitava os seus ensinamentos, que comia os borregos destinados aos sacrifícios, que passava a vida a esfregar o pau e atrás das ovelhas e cabras, que as coitadas já lhe fugiam e até já nem davam leite de tão assediadas que andavam. O mestre, cheio de ira, e a ira de deus é terrível, castigou duramente o Caim, despejava-lhe o bebedouro do gado quando ele acabava de o encher, tirou-lhe o fundo aos baldes, cegou-lhe as enxadas todas e o pobre não conseguia cavar nada, fazia-lhe crescer o pau e punha-lo murcho quando ele se aproximava da melhor cabrita que tinha, não se faz uma coisa dessas a ninguém, enfim, uma caterva de maldades que não passam por qualquer diabólica cabeça. O pobre andava cansadíssimo, estafado, amarfanhado e depressivo. Começou a criar montes de raiva contra o irmão. Um dia quando passou por ele e o safardana se sorriu de forma sacana e pecaminosa, o Caim passou-se dos carretos e pregou-lhe valente cacetada com um osso, talvez de dinossáurio, ele não o sabia mas tinha pertencido a uma perna duma bicheza que andara por ali há uns milhões de anos e o mestre escamoteara essa verdade porque não quis admitir que a Terra já estava formada nesse tempo. Só que a cabeça do Abel era fraquita e não aguentou o porradão e partiu-se em duas. “Ena pá! “Ganda” porra! E agora?” Caim nem sabia como dizer ao Pai e à Mãe o que acontecera. Só lamentava aquele gajo ter uma cabecita de borrego que não aguentava uma cacetada.
Foi uma desgraça. Choro, berros, lamentos, o mestre apontou aquilo como o primeiro crime da história e expulsou Caim que foi obrigado a emigrar e a passar as passas do Algarve que era um sítio bonito à beira-mar e tinha muitas uvas. O certo é que o caso fez jurisprudência e é por isso que se continuam a matar gajos, mas só não se é julgado se for nas guerras, principalmente nas santas.
E foi assim que começou a humanidade. Crime, inveja, pecados carnais e outras merdas.
Adão sentia-se um desgraçado e maldizia o mestre por se ter entretido a fazer um boneco de barro. Mais valia ter deixado correr o marfim e ter ficado quieto. Mais tarde ou mais cedo teriam aparecido muitas mais bichezas, entre elas alguns hominídeos, que um gajo, chamado Darwin, haveria de provar que tinham aparecido por evolução. Ainda por cima estava a ficar velho, a Eva também e, tinham de se apressar para poderem continuar a espécie.
Pobre Adão.
Rui Cabral Telo
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