SARAMAGO, EU E OS DEUSES
Gosto de ler Saramago. Aliás gosto de ler quase tudo, mas Saramago é um dos eleitos. Tenho de me confrontar com as opiniões dos amigos; “Saramago? Esse gajo não sabe escrever” ; “Esse gajo usa mal a pontuação” ; Esse gajo é comuna” etc. etc. Para mim foi um génio da literatura. Escrevia bem, ficcionava excelentemente e quanto a pontuação, bem, acho que era simplesmente inovador. Experimentem pegar num período de Saramago e tentem reescrevê-lo melhor. Verão que não são capazes e que a forma dele resulta bem melhor do que as nossas tentativas. Quem seria capaz de se lembrar de escrever um “Ensaio sobre a cegueira”? Quem seria capaz de escrever este período da última página deste livro quando o médico diz para a mulher: “Por que foi que cegámos, Não sei, talvez um dia se chegue a conhecer a razão, Queres que te diga o que penso, Diz, Penso que não cegámos, penso que estamos cegos, Cegos que vêem, Cegos que, vendo, não vêem.”
Um País de cegos. Qual será? “Tás a ver, o gajo é comuna, é conotado com o diabo”. Eu diria se esse tal de diabo existisse até seria, porque com deus não é de certeza. O diabo é mais fixe, é mau mas não se faz de bom, agora deus é um fingido, diz-se bom mas só tem feito maldades. Pelo menos os que o inventaram e os que têm seguido o hábito e costume de sobre ele escreverem, têm feito um mau trabalho. E daí nem sei, talvez isso até seja programado. Fazendo e construindo um deus mau e colérico é capaz de levar mais o povão. O povão não gosta dos coitadinhos, dos bonzinhos, dar a outra face não vai bem com humanidade. Os homens gostam do confronto, da contestação, de se sobreporem a tudo e a todos, a submissão nunca foi o seu forte. Os deuses foram criados para os poderes conseguirem baixar a crista ao povão. Povo amedrontado e temendo um deus é mais facilmente dominado. Daí a cólera de deus a quem não o teme. Pois… isso talvez fosse bom para judeus, não para todos. Para os outros arranjaram um deus mais bonzinho, e para não ser outro arranjaram-lhe um filho com dupla personalidade, fizeram do filho também pai. Que confusão! Muitos o adoram mas ninguém segue os preceitos do dito. Dele não, dos seus apaniguados. Os seguidores da fé batem com a mão no peito mas continuam maus. A humanidade é má, “ Lá porque Ele era bom nós não temos de ser”. Saramago era inteligente, não ia em histórias da carochinha. Podia seguir uma ideologia que se mostrou também errada como todas as outras, ainda não apareceu a correcta, mas era coerente e mostrava os erros criticando-os, ainda por cima através de obras escritas e muito bem ficcionadas.
Um País de cegos. Qual será? “Tás a ver, o gajo é comuna, é conotado com o diabo”. Eu diria se esse tal de diabo existisse até seria, porque com deus não é de certeza. O diabo é mais fixe, é mau mas não se faz de bom, agora deus é um fingido, diz-se bom mas só tem feito maldades. Pelo menos os que o inventaram e os que têm seguido o hábito e costume de sobre ele escreverem, têm feito um mau trabalho. E daí nem sei, talvez isso até seja programado. Fazendo e construindo um deus mau e colérico é capaz de levar mais o povão. O povão não gosta dos coitadinhos, dos bonzinhos, dar a outra face não vai bem com humanidade. Os homens gostam do confronto, da contestação, de se sobreporem a tudo e a todos, a submissão nunca foi o seu forte. Os deuses foram criados para os poderes conseguirem baixar a crista ao povão. Povo amedrontado e temendo um deus é mais facilmente dominado. Daí a cólera de deus a quem não o teme. Pois… isso talvez fosse bom para judeus, não para todos. Para os outros arranjaram um deus mais bonzinho, e para não ser outro arranjaram-lhe um filho com dupla personalidade, fizeram do filho também pai. Que confusão! Muitos o adoram mas ninguém segue os preceitos do dito. Dele não, dos seus apaniguados. Os seguidores da fé batem com a mão no peito mas continuam maus. A humanidade é má, “ Lá porque Ele era bom nós não temos de ser”. Saramago era inteligente, não ia em histórias da carochinha. Podia seguir uma ideologia que se mostrou também errada como todas as outras, ainda não apareceu a correcta, mas era coerente e mostrava os erros criticando-os, ainda por cima através de obras escritas e muito bem ficcionadas.
“ No dia seguinte ninguém morreu” Primeira e última frase de um dos livros mais recentes de Saramago. Maravilha! Quem se lembraria de tal? Um país onde ninguém morre causa pânico a toda a sociedade. Cada vez há mais velhos, as agências funerárias na falência, passam a fazer enterros de gatos e cães, constitui-se uma máfia para colocar na fronteira os velhos que estão a mais, do outro lado morre-se. Os padres ficam perplexos. “ E agora? Ninguém mais vai acreditar na vida eterna, fica tudo no lado de cá, ” E o conceito de deus? Sacrilégio! As pessoas deixam de acreditar. Para onde irá a igreja? Excelente! E aquela obra fora de série que foi O Memorial do Convento? Um padre que afronta a igreja querendo colocar um objecto a voar pondo em causa os poderes divinos. A construção de um enorme convento, promessa feita aos frades que intercedem pelo divino milagre de conseguir que a rainha emprenhe de um rei quase impotente. O povo que é contratado, diga-se escravizado, para a construção. Povo que, como sempre continua paupérrimo apesar das riquezas trazidas do Brasil, que são gastas a favor do clero e engordam a nobreza. Foi e será sempre assim, as vacas gordas para os poderosos as magras para o povão. Aquele Baltazar Sete-Sóis, sempre irreverente e por isso perseguido. A excepcional personagem que é Blimunda que, quando em jejum consegue ver as entranhas dos humanos e lhes extrai as vontades para as utilizar como energia no poder ascensional da passarola do padre Bartolomeu. O irmão do rei que se entretém a atirar aos marinheiros no Tejo que trabalhavam nos altos mastros das embarcações. Dos comandantes desses barcos que se limitavam a atirar os cadáveres borda fora para não serem alvo da ira real. A santa inquisição que persegue aqueles cujas cabeças são capazes de pensar e colocar em causa as patranhas da lei de deus e dos homens do poder. Enfim, todo um colorido de um país e um povo que desgraçadamente é o nosso.
Já depois da doença que o deixou muito prostrado, Saramago deu-nos “ A viagem do Elefante”. Um rei resolve presentear um arquiduque da Áustria oferecendo-lhe um elefante. A descrição da viagem do bichano até Viena é interessantíssima. O paquiderme é acompanhado por um cornaca, que já tinha vindo da Índia até Portugal, personagem meio filósofo que a todos surpreende com a sua sabedoria de vida. Um livro que se lê de um fôlego, cheio de humor.
Não quero, com estas minhas considerações, chocar aqueles que acreditam em deus ou em deuses, sejam eles quais forem. Respeito todas as crenças. Eu não as tenho, nem em deuses nem quejandos tipo bruxas ou outros, só que às vezes inibo-me e não dou a conhecer as minhas convicções pois os muito crentes, quando me ouvem olham para mim e vêem-me com cornichos e patas de chibo. Ateu é visto pelos crentes como um ser abjecto e hediondo. Não concebem que se possa viver sem deus. Eu vivo e não me considero má pessoa, e os outros também não até alguns conhecerem o meu ateísmo, a partir daí viro mefistofélico. Aliás conheço muito bom crente que deixa muito a desejar como ser humano. Eu já há muito que expulsei os meus fantasmas. Não acredito em nada de sobrenatural. Saramago também era assim. Leiam Saramago pois a descrença dele só se pega a quem tem dúvidas e tem medo de pensar nelas. Só temos a aprender e muito.
Grande Saramago, tanta boa coisa que escreveste. Pena teres morrido. Tinhas ainda muito para nos deixares. Se tivesses continuado a escrever continuaria a deliciar-me a ler-te.
Rui Cabral Telo
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