quinta-feira, 5 de abril de 2012

As Minhas Conversas com Jesus (Fim)

Epílogo


Cheguei muito cedo ao local dos nossos encontros. Pelo aparato percebi que algo se passava de estranho. Um aglomerado de gente rodeava o pedestal, tipo pelourinho, que suporta um cruzeiro, no canto do átrio da Igreja. Outros, no passeio em baixo, esticavam-se curiosos. Um cordão de fitas de plástico limitava uma área com algumas pessoas no interior e vários polícias. Aproximei-me. Um indivíduo encontrava-se pendurado no pedestal de braços abertos e cabeça pendida. Uma mancha de sangue na sua camisa era proveniente de uma enorme ferida na cabeça. Alguns paralelepípedos de calcário tinham sido arrancados ao passeio e estavam espalhados junto ao corpo. Um tipo com estetoscópio estava junto. Aproximei-me um pouco mais e as minhas suspeitas passaram a certezas. Era Jesus. Identifiquei-me a um dos agentes da autoridade dizendo que conhecia aquele indivíduo. Chamou um agente à paisana e falaram durante instantes. Este agente perguntou-me o nome da vítima dizendo-me:
– Ele ainda não está morto. Isto deve ter acontecido esta madrugada pois que não conseguimos encontrar ninguém que tenha assistido. Ou se alguém assistiu ninguém quer falar. Estamos à espera do 112 com um médico. Não o tiramos dali com medo que morra só do movimento. O seu estado é muito grave. Não tem consigo qualquer documento. Diga-me, como se chama ele?
– Só o conhecia pelo nome de Jesus. Ultimamente conversámos aqui mesmo neste local bastantes vezes.
O Homem ficou meio aparvalhado e olhando, ora para mim ora para o corpo da vítima, fazendo um sorriso constrangido. Reparei então que o corpo estava pendurado. Os braços estavam afastados horizontalmente e amarrados a uma tábua que lhe passava atrás das costas. As pernas estavam ligeiramente flectidas e os pés assentes na base do pedestal. Uma corda passada por cima da trave horizontal do cruzeiro tinha servido para elevar o corpo. Pedi licença para me aproximar. Quando estava muito próximo da cara de Jesus, reparei que tentava mexer os lábios. Fingi que observava as feridas da sua cara. Ouvi nitidamente Jesus dizer em surdina:
– Já lhes perdoei...não sabiam o que faziam...
Morreu segundos depois.

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