domingo, 1 de abril de 2012

As Minhas Conversas com Jesus (IX)

Conversa IX


Já há uns dias que não me encontro com Jesus. Não por culpa dele. Penso que por lá terá aparecido ou andará por aí preocupado em fazer passar a sua palavra. Eu é que tenho andado por outros lados, física e mentalmente afastado. Tenho períodos de completa apatia, nada me inspira e nada me interessa. Bem não se poderá dizer que estou, nesses períodos, desinteressado de tudo, não é bem assim, estou é vazio de ideias. Ainda ontem teclando na Internet com uma amiga que não conheço pessoalmente, mas cujo conhecimento através do que colhemos e transmitimos, nos faz parecer que nos conhecemos há muito, me dizia que eu poderia ter com Jesus uma conversa sobre o destino, principalmente daqueles que nada conseguem e não têm oportunidades para coisa nenhuma. Repliquei que todos os seres humanos têm as mesmas oportunidades, só que alguns têm de lutar por elas enquanto outros recebem essas oportunidades de mão beijada. Ela diz-me que não era bem isso de que queria propriamente falar e saber, mas sim dos pobres desgraçados que são confrontados com doenças terminais enquanto outros vivem toda uma vida cheia de saúde. Este tema talvez esteja mais no seu íntimo, uma vez que é Médica Pediatra. Claro que isso para mim não é problema nenhum. A vida é uma sucessão de factos que não estão escritos nem pré-programados. As coisas acontecem com os homens tal qual como com os outros animais e seguem as leis da natureza de onde somos originários. Se a doença fosse um desígnio de deus, não haveria nenhum, por muito mau que fosse, que infligisse a uma única criança, os horrores que certas doenças causam. Também verificamos que nos países da fome, não está lá nenhum deus a decidir quem morre e quem sobrevive. Normalmente são as crianças que morrem mais, porque pelas leis da natureza sobrevivem os mais fortes e esses tornam-se adultos, não por muito tempo, claro. Quem não come morre. É outra das leis naturais. Nesses Países de miséria, ainda não vi aparecer lá um deus a deitar o maná, como os privilegiados Judeus tiveram no caminho para a Terra Prometida. Mais uma vez se confirmam as balelas bíblicas. Porquê aqueles e só naquele tempo? Penso que agora haverá povos muito mais necessitados de apoio divino e que serão tão bons ou melhores que aqueles. Mas o facto é que os deuses actualmente se estão nas tintas para tudo e todos. Pior, são mais privilegiados os ricos e poderosos em detrimento dos que nada têm. Estou farto de dizer isto mas ainda não me cansei.
Enquanto conjecturava, sem me dar conta fui-me encaminhando para o nosso local costumeiro. E lá estava Jesus. Depois do nos termos cumprimentado e tratado daqueles lugares comuns, o que tem feito, por onde andou, e outras coisas do género, lá acabei por lhe falar naquilo que tinha sido o meu pensamento enquanto caminhei.
Jesus, cruzou as pernas como de costume, colocou as mãos nos bolsos, olhou para a biqueira dos sapatos e disse:
– É muito difícil tratar consigo destes assuntos. Você não tem fé. A fé faz compreender o incompreensível. Deus chama para junto de si os mais sofredores para os compensar nos céus.
Jesus deve ter visto a minha cara de parvo perante esta afirmação.
– Caramba Jesus! Esperava de si outra opinião que não essa. Isso já me dizia o estupor do Padre capelão lá no colégio onde estudei, há mais de 50 anos. Bolas! Ainda não aprenderam outras formas de enganar os tais desgraçados da fé? Ao menos arranjem ideias novas e mais coerentes. Só a fé explica tudo? Serão assim tão insondáveis os desígnios de deus?
Jesus continuou:
– Os próprios sofredores preferem o encontro com Deus do que continuar o prolongamento do sofrimento. Eles vêm a luz ao libertarem-se do corpo e subirem aos céus.
– Essa do subirem também é muito subjectivo. O Universo não tem forma e no espaço tanto faz subir como descer, aliás, para qualquer dos lados fora do planeta é sempre subir. Os foguetes que saem da China não descem. Só se desce em direcção à Terra. Mas prendi-me em considerações astrofísicas e não disse o que queria. Diz o meu caro que os sofredores preferem morrer? Será? Então se é assim por que condenar a eutanásia a pedido. Se querem ir por que não deixá-los?
– Ninguém tem o direito de tirar aquilo que Deus concedeu. Só ele pode decidir. Disse Jesus já um pouco agastado.
– Está bem! Não se zangue! Ainda levo algumas chicotadas como um simples vendilhão. Só que tudo isso não me convence. Vamos mudar de assunto. Sabe que a igreja aqui da frente é uma, das de Lisboa, que tem os carrilhões do relógio, com as melodias mais bonitas? Pena que seja eléctrico e não possa ser tocado por mãos humanas, seria interessante ouvir também alguns clássicos e não só música de igreja.
– Pois! Dê-me música, disse Jesus já com um sorriso. Está a ver se me faz esquecer o que disse antes, não é?
– Não! Não é isso. Estou a ver se não o constranjo por não me conseguir dar a volta ao miolo. Sou um bocado duro de roer e vejo que o meu amigo está a ficar um pouco impaciente. Peço desculpa mas sempre fui assim, muito obstinado nas minhas convicções. Os meus amigos que o digam, apanham cada seca...
Olhe, vamos ficar por aqui. Naturalmente voltaremos ao tema. Para a próxima tentaremos falar de coisas terrenas. Talvez tenha mais sorte nas respostas. Boas venturas nas suas deambulações por aí.
– Vá com Deus. – disse-me Jesus.

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