sexta-feira, 13 de abril de 2012

O ASSALTO


O homem, sentado no banco do jardim, chorava silenciosamente. Como chegara àquela situação? O desemprego apanhara-o numa idade ingrata. Sentia-se capaz e útil. O seu cérebro fervilhava de ideias aproveitáveis. Porquê ele? E agora? Como sustentar a mulher e os filhos? O subsídio de desemprego iria acabar e certamente não encontraria trabalho a tempo. Que fazer?
Poderia suicidar-se. E depois? A família ainda ficaria com menos. Ele passava-se e pronto, mas os que cá ficassem?
Olhou em frente e viu montes de gente na esplanada da confeitaria. Será que a crise não os atingiu. A ele nem dinheiro para o café sobrara. Fora ao supermercado e fizera compras mínimas para garantir algumas refeições. Ao lado da esplanada a porta do banco dava entrada e saída a montes de gente. Seria que tinham problemas também? O banco não teria de certeza. Vivem das crises emprestando a quem precisa mas por um preço exorbitante. Os altos juros cobrados compensavam os créditos ditos mal parados. Via-se pelos lucros que apresentavam. Só que o governo não lhes cobrava impostos ao mesmo nível do cidadão. A esses levava coro e cabelo. Porque não cobrar àqueles que só ganham dinheiro com o dinheiro e nada produzem? Ainda por cima, os jornais vendiam-se à custa dos escândalos sobre bancários corruptos e ladrões que defraudavam os respectivos bancos em benefício próprio. E esses não eram presos e ao povo vinham buscar o necessário para salvar o banco. Porca de vida esta. Quem rouba muito com muito fica para poder pagar a sua defesa. O que não falta são advogados que utilizam leis já feitas de propósito para defenderem os que muito têm.
Pensou. Ali, está muito dinheiro que devia estar ao serviço do povo. Apertou a gabardine, meteu a mão direita num bolso e dirigiu-se ao banco. Deixou sair o último cliente e aproximou-se da única caixa. Tinha colocado os óculos escuros e um chapéu. Estendeu um dedo, dentro do bolso e pediu.
− Dê-me todo o dinheiro que aí tem. – Disse, colocando uma pasta no “guichet”. Estava absolutamente calmo e consciente do acto que praticava.
A rapariga ficou a tremer e completamente branca. Enquanto reunia o dinheiro teve discernimento para, com um joelho, premir o botão do alarme. Ao meter as notas na mala que o homem apresentara, deixou-as cair e estas espalharam-se no chão. Levantou-se apressadamente e começou a apanhá-las com muito nervosismo. Lá conseguiu reunir todo o dinheiro entregando-o ao assaltante.
O homem dirigiu-se à porta mas parou estupefacto. Três carros e uma dezena de polícias cercavam as imediações do banco. Pensou correr e fugir, mas logo viu que era impossível. E a vergonha? E a mulher e os filhos? Dentro do bolso encontrou o molho de chaves. Num gesto brusco empunhou a chave maior e apontou-a aos agentes. Sentiu dor no peito ainda antes de ouvir as detonações. Deixou-se cair semi-inconsciente.
A ambulância seguia não muito depressa com o seu característico pi-nó-ni. O Homem via-se 37 anos atrás, naquela madrugada de Abril criadora de todas as esperanças. Via aquele homem de três galões dourados sobre os ombros que lhe dizia:
− Agora tudo vai mudar. Vamos ter justiça neste país. Os homens ficarão melhores e totalmente solidários. Vamos estabelecer o socialismo, vamos dar as mesmas oportunidades a todos. Acabou a exploração do homem pelo homem.
Lembrava-se da cara risonha e serena desse militar. Parece que tinha vindo de Santarém com os seus homens para mudar o estado de coisas a que tudo tinha chegado. Ouvira falar que morrera…
À entrada do hospital os homens da ambulância corriam empurrando a maca. Um polícia acompanhava a mesma não fosse o homem fugir. Um médico correu ao lado e colocou a mão no pescoço do paciente.
− Não corram mais. Não vale a pena. Acabou de falecer.

1 comentário:

  1. Eu não te avisei? Saiste dessas conversas com Jesus que não davam que pensar a niguem,por demais conhecido o blá, blá, dos vendedores de mitos em que só os incrédulos acreditam. Entraste "na real". Pelo andar da carruagem a procissão ainda vai no adro. É preciso é acalmar os mercados, dizem eles, como se os mercados fossem mais ingénuos do que nós. Mas o que mais me revolta é a injustiça, descarada, com que os mandantes deste Paìs querem resolver os problemas sempre à custa dos mais fracos. As medidas normalmente anunciadas com um sorriso "sacana".
    O desespero desse teu personagem não é ficção é real, é suicidio, aconteceu o mesmo na Gécia, há bem pouco tempo, basta assistir ao noticiário para o desespero se apoderar das pessoas.
    J. Cruz

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